Laila Pas em cena de Planeta Escarlate, 2016, de Dellani Lima e Jonnata Doll
No penúltimo dia – ontem, sexta, 29 - da 19ª Mostra de Cinema de Tiradentes, a prioridade do Mulheres foi conferir três longas que foram exibidos no Cine-Tenda.
A noite começou com a apresentação do último filme da Mostra Transições: Planeta Escarlate (2016), produção mineira de Dellani Lima e Jonnata Doll.
O filme parte da ideia de que a passagem pelo tal Planeta Escarlate pela órbita da Terra evidenciaria os impulsos incontroláveis das pessoas, a não ser aquelas que se elevassem no plano astral. Com essa premissa, a trama se centra em quatro personagens: o casal de namorados da cidade que retorna à casa do interior; o jovem caseiro; e por fim o amigo desse último, um misto de bad boy e agiota.
O casal está em crise, ele é um viciado em drogas, e ela, sobretudo naquela viagem, está interessada em outro estado de coisas. A presença dos dois afeta os demais, já que o caseiro, inflado pelo amigo, se sente injustiçado pela família do rapaz; já o agiota fica completamente fissurado na bela mulher.
Planeta Escarlate é filme de gênero que se assiste sem se desvencilhar. O universo de Dellani está todo ali – o cinema de Jonnata não conheço. Os personagens estão deslocados de qualquer ordem, daí que oscilam de estado entre uma cena a outra – Laila Pas, a protagonista, é quem se sai melhor nesse registro; aliás, Laila é ótima revelação do cinema atual, daquelas atrizes essencialmente cinematográficas que, felizmente, aparecem de tempos em tempos nas nossas telas.
Há uma melancolia que perpassa cada plano, mesmo que um fiapo de felicidade se insinue. Harmonia, paz e final feliz são elementos que sabemos impensáveis desde o início, mesmo que, do lado de cá, fiquemos torcendo para que a tragédia não se instale.
O Planeta Escarlate encerrou bem a Mostra Transições, que se revelou como programação de destaque dessa 19ª edição.
O segundo filme da noite foi, e no caso o penúltimo da Mostra Aurora, a produção paulista Jovens infelizes ou um homem que grita não é um urso que dança (2016), dirigido por Thiago B. Mendonça.
O filme é essencialmente político, política do corpo e política de reinvindicação de espaço, seja físico ou simbólico. Realizado e encenado por atores do teatro, Jovens infelizes apresenta interessante diálogo entre cinema e teatro – ainda que seja levando a cardiografia do segundo para o primeiro que encontra resultados melhores.
Ainda que haja cenas dispensáveis – não pelo simbolismo, mas pela execução não muito feliz -, como a da orgia na igreja e a das cruzes, o filme consegue dar pulsão ao que se propõe. Para isso, o diretor contou com atores em pleno ato de entrega, o que faz todo o diferencial no mostrado.
O último longa – e último da Aurora – foi o comentado Animal político (2016), produção pernambucana dirigida por Tião.
O filme tem como protagonista uma vaca, daí durante a primeira metade temos à nossa frente uma divertida e inusual composição fílmica, em que ela habita, percorre e protagoniza ambientes cotidianos diversos. Ela faz academia, sopra bolo de aniversário, festeja o natal, faz compras no shopping e frequenta restaurantes.
Na segunda metade, marcada por um vazio existencial, ela toma outro percurso, o que seria um tipo de iluminação. Com isso, se num primeiro momento o retrato crítico de todo um estilo de vida – sobretudo o da classe média - se dava mais pelo imagético, a partir daí os caminhos vão se tornando mais filosóficos.
Anima Político, que acabou de ser indicado para o Festival de Roterdã, é um filme - em alguns momentos imperfeito - do cada vez mais indesviável cinema pernambucano, ainda que a gramática aqui seja bem particular.
19ª Mostra de Cinema de Tiradentes – Programação completa
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