Credito: Leo Lara/Universo Produção
Alguém ainda se lembra do Fotolog? Pois bem, foi nesse formato que começou o site Mulheres do Cinema Brasileiro. Como já contei mais de uma vez por aqui, a gênese do trabalho de pesquisa e mapeamento das mulheres do cinema brasileiro, desde a fase muda até a atual, se deu ao assistir o trailler do filme “Eros, o deus do amor” (1981), de Walter Hugo Khouri. Fiquei impactado pela beleza daquele trailler – e depois me apaixonaria pelo filme e pelo cineasta -, que comecei, informalmente, a prestar mais atenção nas atrizes do nosso cinema. Em 1991, a pesquisa virou coisa séria, até que em 2003 comecei a disponibilizar os dados no então Fotolog. Para quem não sabe, era um formato da net como se fosse uma grande foto-legenda, publicava-se uma foto e abaixo vinha o texto.
Assim, durante oito meses, publiquei no Fotolog Mulheres do Cinema, de 31 de julho de 2003 a 17 de março de 2004, homenagens para 164 atrizes. Como a pesquisa cresceu e ampliei não mais apenas para as atrizes, mas, de forma bem ambiciosa, para todas as mulheres do cinema, em suas diferentes áreas, em 12 de maio de 2004 nascia o site, premiado em janeiro de 2005 com o troféu Quepe do Comodoro Especial, premiação criada pelo saudoso e querido cineasta Carlos Reichenbach.
Sempre assisti, durante a infância, adolescência e primeira juventude, muitas novelas, e , com isso, conhecia várias atrizes daquele veículo, e que também atuavam no cinema. Com a pesquisa, passei a conhecer também muitas atrizes que eram, e são, essencialmente cinematográficas. E passei a conhecer também as demais mulheres que compõem uma ficha técnica.
Só que estamos falando da década passada, e, saibam, havia uma diferença enorme entre as fontes de pesquisas disponíveis naquela época para as de hoje. E uma das fontes fundamentais para a pesquisa do Mulheres desde o início foi o livro Astros e Estrelas do Cinema Brasileiro - o Dicionário de Atrizes e Atores, que o pesquisador Antonio Leão da Silva Neto lançou em 1998. Não conhecia o querido Antonio Leão ainda, só que seu dicionário virou fonte de cabeceira.
Depois, Leão, como o chamamos, publicou outras publicações fundamentais, como o Dicionário de Longas, o Dicionário de Médias e Curtas, e, mais recentemente, o de Super 8. E também tive a felicidade de tê-lo como amigo.
Pois bem, Antônio Leão foi, mais que merecidamente, homenageado pela 12a Cineop – Mostra de Cinema de Ouro Preto. A Cineop, que aconteceu de 21 a 26 de junho na cidade histórica patrimônio da humanidade, e arrebatou público de mais de 15 mil pessoas com uma programação intensa e gratuita formada por exibição de longas, médias e curtas, oficinas, exposição, seminários, debates, lançamento de livros, cortejo da arte, atrações artísticas e muito mais.
Assim como fez com a montadora Cristina Amaral, homenageada do recorte Histórico na Cineop, o Mulheres do Cinema Brasileiro faz também agora sua homenagem a Antônio Leão, laureado no recorte Preservação da Mostra.
O Mulheres do Cinema Brasileiro esteve com Leão na Cineop, que depois, gentilmente, concedeu por e-mail a entrevista abaixo.
Mulheres do Cinema Brasileiro: Meu primeiro contato com a sua obra foi a partir da primeira edição de seu Astros e Estrelas do Cinema Brasileiro, que sempre foi fonte indispensável para o site Mulheres do Cinema Brasileiro. Como surgiu a ideia dessa publicação?
Antônio Leão: Surgiu despretensiosamente, a partir de anotações que eu fazia para uso próprio, pois tinha uma grande acervo de filmes 16mm brasileiros, mas não tinha literatura nenhuma sobre isso. Montei um grande arquivo com mais de 5000 fichas, nais quais anotava os dados dos filmes e dos atores/atrizes. Esse arquivo está depositado na Faculdade Metodista de São Bernardo do Campo.
Mulheres do Cinema Brasileiro: Imagino que tenha sido muito difícil todo aquele mapeamento na época. Gostaria que comentasse a respeito.
Antônio Leão: Quando resolvi fazer o livro, comecei a pesquisar de fato para complementar os dados que faltavam. Não existia internet, muito menos redes sociais, então fui em bibliotecas, cinematecas, fiz contato com atores, produtores, diretores etc. O livro foi tomando corpo.
Mulheres do Cinema Brasileiro: Depois você lançou várias publicações, como os não menos indispensáveis Dicionário de Longas, Dicionário de Curtas e Médias, e Dicionário de Super 8. Como consegue levar à frente obras de tão grande envergadura?
Antônio Leão: É uma loucura, nem eu mesmo sei, vou fazendo, fazendo, vão surgindo as ideias. Depois do primeiro, que teve uma grande aceitação no meio cinematográfico, sendo elogiado por jornalistas, pesquisadores, restauradores, os próprios atores, que nunca haviam sido homenageados. Isso me impulsionou a continuar. No primeiro livro tive patrocínio da Fundação Nestlé de Cultura. O segundo ninguém se interessou, fiz com meu dinheiro, mas depois recuperei, pois o livro foi vendido para todas escolas estaduais de São Paulo.
Cada livro foi tendo sua própria história, até culminar com o Super-8, sem dúvida o mais difícil em todos os aspectos, numa pesquisa difícil, com pouca literatura e depois nenhum interesse de ninguém em publicar. Acabei partindo para o financiamento coletivo, em que consegui 50% do valor, o restante eu coloquei do bolso, e agora estou lutando para recuperar na venda do livro. Mas como sempre, estou muito feliz por ter feito, era necessário, veja quantas informações estavam perdidas, mais de 5500 filmes.
Mulheres do Cinema Brasileiro: Fale um pouco sobre sua paixão pelo cinema brasileiro.
Antônio Leão: Começou na infância com o Vigilante Rodoviário e vendo filmes do Mazzaropi. Quando comecei a colecionar filmes percebi que os filmes americanos, franceses ou italianos sempre vinham completos, e os brasileiros em pedaços, eram poucas cópias e muito exibidas. Não tinha informação nenhuma, comprei essa briga. Eu ia nas livrarias especializadas e só tinha livro sobre cinema americano, nada sobre cinema brasileiro, pensava, vou ajudar a mudar essa história. Acho que dei uma cota de colaboração.
Mulheres do Cinema Brasileiro: Já tive a honra de ter aqui no site sua bela homenagem para Carmen Santos. Gostaria que homenageasse outra mulher do cinema brasileiro de qualquer época e qualquer área aqui nessa entrevista.
Antônio Leão: Eva Nil.
Mulheres do Cinema Brasileiro: Cite de cinco a 10 atrizes que considera fundamentais na história do cinema brasileiro.
Antônio Leão: Listei 18, cada uma teve uma importância diferente para nosso cinema:
Carmen Santos, Ruth de Souza, Eliane Lage, Eliana Macedo, Norma Bengell, Odete Lara, Fernanda Montenegro, Helena Ignez, Gilda de Abreu, Tonia Carrero, Sonia Braga, Aurora Duarte, Marlene França, Carmen Miranda, Zezé Motta, Eva Nil, Vanja Orico, Marília Pêra.
Mulheres do Cinema Brasileiro: A homenagem que a Cineop fez a você é mais que merecida. Conte para nós como recebeu a notícia e como foi subir ao palco do Cine Vila Rica para receber sua homenagem.
Antônio Leão: Quando Raquel (Hallak, da Universo Produção, realizadora da Mostra) me ligou fui pego de surpresa, não esperava, pois esse tipo de trabalho de pesquisa não é valorizado no Brasil. Durante os 30 dias que antecederam ao festival correu um filme na minha cabeça, de toda minha trajetória desde criança, catando fotogramas na Boca do Lixo etc. Fiquei feliz e emocionado, pela homenagem em si, por ser no Cineop, e também por ser no meio das maiores feras da preservação do Brasil, todos amigos da ABPA.
Entrevista realizada por e-mail no dia 01 de julho de 2017.