Ano 20

7a Mostra de Cinema de Gostoso - Parte 4

Cena de Boi de prata (1980), de Carlos Augusto Ribeiro Júnior.
Além dos filmes da Xanadu Produções Cinematográficas, fundada na década de 1960 pelos cineastas Carlos Reichenbach, João Callegaro e Atônio Lima, As Libertinas e Audácia!, outro destaque do programa Sessões Especiais da 7a Mostra de Cinema de Gostoso é a exibição do longa Boi de prata, de Carlos Augusto Ribeiro Júnior.

Boi de prata é o único longa desse cineasta nascido em Caicó, Rio Grande do Norte, em 1949, que também dirigiu curtas e foi aluno e assistente de direção de Nelson Pereira dos Santos em O amuleto de Ogum (1974). É um filme raro de ser exibido, e, por isso, junto aos filmes da Xanadu, o Sessões Especiais é mesmo um grande destaque de toda a programação da mostra. O filme foi produzido, escrito e dirigido por Ribeiro Júnior.

Boi de prata tem como locação o sertão de Caicó, onde o poeta de literatura de cordel, Tião Poeta (Lenício Queiroga),  e o vaqueiro Antonio (José Marinho) têm que enfrentar a fúria capitalista do herdeiro da fazenda do falecido pai latifundiário, no seu retorno à terra natal depois de estudos na Europa, onde viveu com a esposa.

Eloi Dantas (Alvaro Guimarães), o herdeiro, e sua esposa Beatriz (Fátima Barreto) formam um casal kamicase, o tempo todo calibrado de álcool e cocaína, em meio à uma comunidade rural que vivencia suas crenças, folguedos e estilo de vida, vistos pela dupla como caipiras e atrasados. Daí, que querem instalar uma mina de minério na região e, para isso, usam de todos os meios para se apropriarem da terra de Antonio Vaqueiro, antigo funcionário da fazenda.

Boi de prata é um filme notável e que nos seduz desde o início, quando as imagens do poeta ensanguentado perambulando em agonia pelo sertão tem a visão mítica do tal boi de prata que dá título ao filme. Acudido por ciganos, acompanhamos, então, a partir daí, todo o enredo que se desfilará entre o embate, luta e resistência da cultura local frente à exploração e a violência latifundiária.

A cada avanço da narrativa, a resistência cultural vai se tornando mais política em seu sentido mais amplo, em que só com a reação coletiva um possível enfrentamento poder vir a cabo, mesmo que custe o sacrifício e aniquilamento individual. Como um enfrentamento da resistência do cordel e das crenças populares, como ritos, benzições, devoções e festas tradicionais e afirmativas, irmanados para frear a sanha exterminadora.

Em depoimento disponibilizado pela Mostra, o fotógrafo e cineasta Walter Carvalho comenta sobre a produção, ressaltando, inclusive, que foi seu primeiro trabalho como fotógrafo em um filme de ficção. É uma bela estreia e seu trabalho é um acerto, pois ao mesmo tempo que registra as cores e a aridez da geografia local, capta também a temperatura do solo, personagens e modos de vida, encharcados de suor e sangue.

Boi de prata é encenado praticamente com atores locais, além do baiano Alvaro Guimarães e da mítica Luíza Maranhão. Atriz de destaque no cinema da década de 1960 e notadamente vinculada à primeira fase do Cinema Novo, período no qual brilhou em filmes como A grande feira, de Roberto Pires, Assalto ao Trem Pagador, de Roberto Farias, Barravento, de Glauber Rocha, e Ganga Zumba, de Carlos Diegues.

Luiza Maranhão está maravilhosa em Boi de prata, em que interpreta vários personagens, sendo o principal deles a esposa de Tião Poeta, Maria dos Remédios, uma guardião mística de sua casa, família, e da cultura local. Uma das características mais fortes da persona da atriz é a altivez natural, o que impregna a lente do cinema em cada filme em que atua, e em Boi de prata não é diferente. É como uma Rainha em meio à uma realidade bruta. Suas outras personagens no filme são a Cigana Salomé e a Cabocla Jurema

Ainda no elenco feminino, destaque também para Fátima Barreto como Beatriz, a esposa de Eloi, uma mulher  aloprada e entediada com o local, e calibrada de álcool e drogas 24 horas. A atriz marca presença também como assistente de direção, nos diálogos e continuidade do filme.

Boi de prata conta ainda com ótima música de Mirabô, direção de produção de Sanin Cherques, e com a participação do Boi Calemba de São Gonçalo do Amarante e do Grupo de Teatro Amador de Caicó.

A 7a Mostra de Cinema de Gostoso, de São Miguel do Gostoso (RN), começou no último dia 10 e vai até o dia 14/03, domingo, com uma ótima programação gratuita e virtual, em função da pandemia da Covid-19..

A programação é formada por exibição de filmes, curtas e longas, masterclasses, cursos, Lab. Os filmes são divididos em cinco programas: Mostra Nacional, Mostra Acervo, Mostra Coletivo Nós do Audiovisual, Sessões Especiais, Sessão Cinelimite.


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7a Mostra de Cinema de Gostoso
De 10 a 14 de março de 2021
Exibições gratuitas
mostradecinemadegostoso.com.br


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Sala 
 Betty Faria
Com amor profundo pelo cinema, premiada em vários festivais no Brasil e no exterior