Apresentação dos curtas - Crédito: Leo Lara
Não bastassem todas as qualidades de Amor, plástico e barulho, de Renata Pinheiro, o segundo dia da programação do Seminário Encontro com a Crítica, Diretor e Público, da 17ª Mostra de Cinema de Tiradentes, sobre o filme pernambucano tornou o visto ainda mais saboroso pela presença do crítico convidado Ismail Xavier.
Em mesa na manhã de ontem, 27, que contou com a cineasta, o roteirista Sérgio Oliveira e a montadora Eva Randolph, mediada pelo jornalista Paulo Henrique Silva, Ismail encantou a plateia com seu brilhantismo.
Concorde-se ou não com a abordagem que ele apresentou sobre o filme - e que foi bem interessante -, a apresentação de suas reflexões é tão brilhante que é difícil não se deixar seduzir. Ismail Xavier é o tipo cada vez mais raro, sobretudo na nova geração, de intelectual que não se vangloria do umbigo e do talento, mas daqueles que se debruçam sobre seu objeto não para esbanjar erudição, mas tornar o conchecimento acessível e sem firulas.
Se a altíssima qualidade do cinema pernambucano é cada vez mais reverenciada por todos, para Ismail é a produção do estado a que apresenta a maior coerência interna de reflexão sobre o Brasil.
E Amor, plástico e barulho é mais um representante do que de melhor está sendo produzido em solo pernambucano e no país.
Se em Pernambuco, Recife é a cereja do bolo, em Minas Gerais uma inesperada cidade se tornou indesviável quando se pensa atualmente em relevância artística cinematográfica: Contagem.
A noite da programação da Mostra desta segunda foi marcada por dois grandes filmes realizados na cidade: o longa A vizinhança do tigre, de Affonso Uchoa, e o curta Quinze, de Maurílio Martins.
Cidade-sede da Filmes de Plástico, produtora que reúne os cineastas André Novais de Oliveira,, Gabriel Martins e Maurílio Martins, mais o produtor Thiago Macedo Correia, e que já nos deu filmes como Filme de sábado (2009), Contagem (2010), e Fantasmas (2010), Contagem conta também com o talento de Affonso Uchoa.
A vizinhança do Tigre abriu ontem a programação da Aurora, mostra competitiva dentro da programação da Mostra de Tiradentes, que apresenta filmes realizados por cineastas que tenham realizado até três longas.
O filme focaliza cinco personagens, todos adolescentes ou jovens, que vivem no bairro Nacional, na periferia de Contagem.
Trazer para as telas jovens pobres da periferia já embute de antemão na plateia a expectativa de ver códigos mais que decifrados até pelo nais ordinário jornalismo do dia a dia. Só que A vizinhança do tigre dá uma rasteira em ideias preconcebidas e arraigadas com seu imbatível time de protagonistas, que mistura performance e realidade em um jogo irresistível pontuado por dramas e alegrias.
A vizinhança do tigre pode tanto fazer rir às gargalhadas com as situações e diálogos hilários e performances altamente improvisadas, como também suscitar silêncios e comoção subterrâneas.
Ainda na geografia de Contagem, um dos curtas exibidos na programação Foco - Série 1 foi Quinze, de Maurílio Martins.
O filme sobre a mãe que fará de tudo para proporcionar à filha o baile de 15 anos é chave para que Martins desarticule com altíssima propriedade os clichês que permeiam o universo das debutantes.
Ao mostrar a apatia da filha - ótima presença da atriz Malu Ramos - em relação à festa, Quinze nem precisa de mais explicação para deixar claro que o desejo de celebração é da mãe. E é esse desejo, e o que advém dele, que estará em primeiríssimo plano na dramaturgia.
E aí tem a mãe, e que definitivamente não é uma mãe qualquer.
Moradora pobre da periferia, ela é a a mesma mulher que arde de desejo pela namorada (Rejane Faria) em sexo desencanado e conta divertida para a filha o quanto passou o rodo geral quando adolescente, como também a que parcela as compras da festa no cartão e toma banho gelado por ter deixado a luz ser cortada por falta de pagamento.
E se ela não é uma mãe qualquer, a atriz também não é uma qualquer, pois é nada menos que Karine Teles, um desses talentos absurdos que o cinema brasileiro não para de revelar.
Karine Teles parece não apenas ceder o corpo, mas toda a alma para sua personagem singularíssima, tornando crível cada movimento e curva dramática. É presença inesquecível - a citada conversa sobre sexo entre mãe e filha é ponto altíssimo.
Quinze é filme de destaque que reafirma o talento de Maurílio Martins e a relevância cada vez maior da Filmes de Plástico.
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24 de janeiro a 1º de fevereiro de 2014
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