Ano 20

Rita Cadillac

Rita Cadillac nasceu no Rio de Janeiro, em 13 de junho de 1954. Eternizada como símbolo sexual no imaginário popular brasileiro, ela se consagrou nos programas de auditório do Chacrinha, em que incendiava a telinha da TV encarnando a chacrete fatal, de 1974 a 1983, passando pela Tupi, Bandeirantes e Globo. Foi uma consagração e abriu caminho para que ela desenvolvesse sua carreira em outras áreas. “Eu acho que o Chacrinha tinha uma visão muito grande e ele sabia quem poderia ter uma carreira para a frente, quem poderia seguir a estrada. Então eu acho que por isso que ele não se incomodava quando eu fazia os trabalhos”. 

A estreia no cinema se deu em Asa Branca: um sonho brasileiro (1980), de Djalma Limongi Batista. “O Djalma estava procurando uma atriz para fazer aquele personagem, que era a  Silvia, e ele não queria uma pessoa conhecida, ele queria uma pessoa totalmente desconhecida. Por acaso, ele estava vendo televisão junto com o José Possi Neto e  nessa hora passou a Rita Cadillac no programa do Chacrinha. E ele falou “É essa, é essa que eu quero”. E o José Possi Neto a mesma coisa “É ela, ela é a personagem, ela é a Silvia”. Ele veio me procurar, marcou para eu ir ao estúdio dele, escritório dele, e eu fui. Ele até conta isso no meu documentário,  que eu cheguei lá de tênis, calça jeans e uma camisetinha bem basiquinha mesmo, do jeito que eu gosto de andar. E ele, todo mundo se decepcionou, né. Achou que ia chegar aquele puta mulherão, aquela vamp, aquela Rita Cadillac, né, que olhava nos olhos do povo e tudo, e de repente não, chega uma menina à vontade, rabo de cavalo, uma coisa assim bem basiquinha”.

A partir daí, Rita Cadillac faz vários trabalhos na televisão, no cinema, e também grava disco e faz shows pelo país. Com Deni Cavalcanti faz os sucessos Aluga-se moças 1 e 2, protagoniza O Vale dos Amantes, que ele produz e protagoniza ao lado, dirigido por Tony Rabatoni, e incendeia as telas em participação inesquecível em Carandiru (2003), de Hector Babenco. “O filme é baseado no livro do Dráuzio Varela, aquela personagem não podia faltar, pois faz parte da história do Carandiru. Já aquela cena da garrafa eu nunca tinha feito aquilo, confesso que fiquei com medo depois. A cena acabou, eu fui para casa e pensei “Vão me sacrificar, vão acabar comigo, porque vão imaginar que eu fazia aquela cena, pegar a garrafa e botar na boca, boquinha da garrafa, aquela cena de colocar a camisinha na garrafa, vão me crucificar”. Eu fiquei com medo mesmo, mas dessa vez eu acho que o pessoal entendeu, porque é uma coisa que eu mostrei de prevenção, né?”

O cineasta Toni Venturi dirige o documentário Rita Cadillac, a Lady do Povo (2007), e coloca no centro da tela a história da mulher e da artista. “Ele me procurou, disse que queria conversar , pois queria fazer um filme comigo. Eu então disse tudo bem, que ele poderia ir à minha casa. Daí ele chegou e já foi dizendo que queria fazer um documentário sobre a minha vida, achei que era pegadinha. Respondi “Não sei que vida, não acho que a minha vida dá um documentário”, mas ele disse que eu podia achar que não, mas que dava sim “Vamos fazer um acordo, você não vai esconder nada de mim, ok”.

Rita Cadillac concedeu entrevista exclusiva e ao vivo para o Mulheres do Cinema Brasileiro, e repassa sua trajetória, o programa do Chacrinha, os trabalhos no cinema, participações na TV, sua carreira em shows, e muito mais.

Mulheres do Cinema Brasileiro: Rita, você atuou como chacrete durante muito tempo, uns 10 anos ou quase, não é isso? Foi de 1974 a 1983?

Rita Cadillac: 1983 foi o final, quando eu sai.

MCB: No programa, você já criou uma personagem, que era aquela mulher fatal, que não ria, que movimentava os dedinhos. Mas quando foi na hora de ser atriz foi muito difícil para você?

RC: Não, difícil não foi, mas fácil fácil não, porque era outra coisa,  primeiro filme. Cinema é bem diferente de TV, né, então não foi tão fácil assim, mas também não foi difícil, deu numa boa. Agora, eu acho que sou péssima atriz, eu sou maior canastrona, eu mesmo digo isso, mas também vou dizer uma coisa “Agora eu vou fazer cursinho para ser atriz, vou me tornar uma, pode deixar”.

MCB: Você já era muito acostumada com estúdio, mas teve uma diferença. Você se lembra quando pisou pela primeira vez em um set de cinema?

RC: É bem diferente, é muito diferente. Porque televisão, pelo menos o que eu estava acostumada com negócio de televisão, era chegar de manhã, ensaiar e depois ir para a maquiagem, daí se arrumar e ir para o programa e dançar. Então você sabia que tinha que olhar para aquela câmera, indicava o que você tinha que olhar. Já cinema você não pode nem olhar para a câmera, então o vício de você olhar, várias vezes eu me pegava olhando. Ficou mais difícil, porque no cinema você dá um take, fala, para, faz de outro ângulo, muda a inclinação. E você tem que fazer a mesma cena da mesma forma conforme você parou, então é um pouquinho mais difícil.

MCB: Mesmo porque era sua marca, você olhava no olho do espectador do programa, não é isso?

RC: Pois é, eu olhava na câmera ali. Em filme você não pode olhar, então era uma briga comigo mesmo. 

MCB: Você passou pela Tupi, Bandeirantes e Globo.

RC: Isso, três emissoras.

MCB: Mas diferentes formas de produção, não é? Mudava muito na sua vida de Chacrete? 

RC: Olha, mudou muito. Porque Tupi era Rio e depois nós fomos para a Band, já em São Paulo, e aí eu tive que me mudar para São Paulo. A produção do programa era sempre a mesma, que era uma produção fixa do próprio Chacrinha. O que mudava era negócio de cabeleireiro, essas coisas, e a parte técnica, na parte técnica a gente não se metia. Então para nós não tinha muita mudança não. Onde eu acho que senti, que todas devem ter sentido um pouco mais de mudança, foi na Globo porque era bem diferente. A Globo já era uma regra mais,  não profissional porque porque todas eram profissionais, óbvio, mas acho que tinha um pouco mais de regras, então ficou um pouco mais diferente.

MCB: Asa Branca: Um sonho brasileiro, do Djalma Limongi Batista, é o seu primeiro filme, não é isso? Como surgiu esse trabalho?

RC: O Djalma estava procurando uma atriz para fazer aquele personagem, que era a  Silvia, e ele não queria uma pessoa conhecida, ele queria uma pessoa totalmente desconhecida. Por acaso, ele estava vendo televisão junto com o José Possi Neto, e  nessa hora passou a Rita Cadillac no programa do Chacrinha. E ele falou “É essa, é essa que eu quero”. E o José Possi Neto a mesma coisa “É ela, ela é a personagem, ela é a Silvia”. Ele veio me procurar, marcou para eu ir ao estúdio dele, escritório dele, e eu fui. Ele até conta isso no meu documentário,  que eu cheguei lá de tênis, calça jeans e uma camisetinha bem basiquinha mesmo, do jeito que eu gosto de andar. E ele, todo mundo se decepcionou, né. Achou que ia chegar aquele puta mulherão, aquela vamp, aquela Rita Cadillac, né, que olhava nos olhos do povo e tudo, e de repente não, chega uma menina à vontade, rabo de cavalo, uma coisa assim bem basiquinha. Então ele me convidou, me perguntou se eu aceitava e eu falei “Você que tem que dizer, né, aceitar eu aceito, mas é uma coisa que é difícil, nunca fui atriz, nunca fiz”. O José Possi Neto me dirigiu muito bem, graças a Deus, então eu comecei aí no cinema. 

MCB: Foi o Possi que fez o trabalho de direção de atores? 

RC: Foi, foi o Possi Neto, Possi com Djalma, os dois.

MCB: E aquela personagem, que é uma vamp... 

RC: Porque pela época, é gozado, é uma personagem que eu acho que o Djalma imaginou que seria aquele tipo de presidente do clube, que é mas velho, que é casado com uma garota mais nova. E ela vê aqueles homens todos gostosos, maravilhosos, e acaba se envolvendo com um jogador. Então eu não posso falar porque é uma coisa real, mas vamos dizer que a Silvia era uma, a famosa Maria chuteira, né?

MCB: E a personagem foi muito valorizada no filme, eu me lembro nitidamente de uma cena marcante, a sedução dela do personagem Asa Branca,  que era do Edson Celulari. Ela com a echarpe,tentando ele o tempo inteiro. 

RC: Era uma coisa meio assim hollywoodiana, né, aquele negócio assim me ajudou.

MCB: E tem a Cida Moreira cantando lindamente.. 

RC: É, uma coisa que eu acho que quase ninguém sabe é que a Cida me dublou no filme. Porque na época da dublagem eu não pude porque estava trabalhando com o Chacrinha e foi em uma época que a gente foi viajar para o norte e nordeste. Ia ficar mais de uma semana, e o Djalma precisava já dublar o filme, daí ele me perguntou se eu me importaria da Cida fazer a dublagem e falei que não, tudo bem, que achava até melhor porque até eu sincronizar o que eu estou falando na fita e botar a voz em cima ia demorar. Mas deu tudo certo, acho que ficou legal, e todo mundo imagina até que é a minha voz, ficou bem parecida mesmo.

MCB: E como foi a repercussão na época, você se  lembra? 

RC: Ah, foi um arraso, né? Quer dizer, para mim foi tudo um arraso esse filme, porque pela primeira vez eu entrei no circuito de cinema. que era um outro mundo, não era o mundo da Rita Cadillac. Era um outro mundo, então eu passei a frequentar festivais, para mim foi ótimo. A repercussão foi ótima, as pessoas me procuravam até para depois vir a fazer filme, acabou surgindo outras oportunidades. Se eu quisesse, eu poderia até ter seguido mais por esse lado, não sei se eu fiz certo ou errado, mas eu acho que eu fiz o meu caminho certo, que tinha que ser trilhado.

MCB: Você gosta do filme? 

RC: Eu gosto, você vendo agora é gozado, né, é estranho, mas para a época a produção foi ótima. Gastou-se bastante para a produção, foi muito bem feito, as locações, tudo, foi no Morumbi, mansões lindas, foi muito legal. Eu adoro o filme, mas se hoje você vai ver o filme eu me vejo tipo assim “Meu Deus, que horror!”. Mas é legal, é um marco para mim, eu acho  que é um marco para o filme, para o próprio Edson Celulari, foi o primeiro trabalho profissional dele, foi dali que ele passou a ser Edson Celulari. Então eu acho que é um filme marcante, tanto marcante para a Rita, quanto acho que para o Edson.

MCB: Eu acho um belo filme até hoje.

RC: Eu gosto, é divertido, eu acho que seria bem legal se agora fizesse uma versão.

MCB: Quando você fala que é canastrona, você não está sendo muito rigorosa na sua autocrítica? 

RC: Não, eu sou, eu fico muito crítica comigo mesma, as pessoas falam “Não Rita, estava bom o seu trabalho”, mas eu não consigo, eu acho que se eu  fizesse hoje ficaria bem melhor, óbvio. Mas como primeira experiência foi até boa, mas eu sou meio caxias comigo nesse sentido.

MCB: O Chacrinha se incomodou com a sua carreira artística? 

RC: Não, não se incomodou com nada não, não atrapalhando na época o programa dele, as viagens, ele não se incomodava com isso. Porque eu acho que ele via que eu estava fazendo um trabalho sério, era um trabalho certo, era um trabalho que poderia me crescer muito. Então quando eu digo que o Chacrinha tinha uma visão muito grande, porque as pessoas falavam que a Rita era a protegida do Chacrinha, mas não, eu não era a protegida do Chacrinha. Eu acho que o Chacrinha tinha uma visão muito grande e ele sabia quem poderia ter uma carreira para a frente, quem poderia seguir a estrada. Então eu acho que por isso que ele não se incomodava quando eu fazia os trabalhos, porque tudo que a gente fizesse fora do programa a gente pedia autorização, e eu nunca pedi, eu sempre fui louca mesmo. Se falassem “Você topa fazer esse filme?” Se eu topar eu vou e não pergunto, não vou dar satisfação a ninguém, eu vou, faço e acabou, eu sempre fui assim. Mas o Chacrinha nunca me repreendeu, nunca puxou a minha orelha nesse sentido, porque ele viu que eu estava querendo era crescer, poder melhorar, né, então eu acho que é por isso. 

MCB: O Segundo filme é o Tessa, a Gata, do John Herbert?

RC: É.

MCB: Esse filme eu não conheço, tenho muita vontade de assistir.

RC: Aí foi uma cena só, era uma briga de mulheres  no ring, no qual eu, a Índia Poti e a Lia Hollywood fazíamos uma participação, foi muito pequena. Eu acho que nem eu mesma vi esse filme, eu só me lembro disso.  A pior coisa que tem no cinema é que você grava uma semana para passar em um segundo, né, num piscar de olhos. Mas ok. Depois dele veio o Aluga-se Moças.

MCB: Do Deni Cavalcanti.

RC: Deni Cavalcanti, e aí ele resolveu fazer  as sequências.

MCB: Nesse primeiro, ele reúne as duas que eram consideradas, e até hoje são, as rainhas do bumbum, você e Gretchen. Como foi a convivência nesse filme, que fez muito sucesso.

RC: Foi tranquilo porque cada uma filmava separado, não tinha, nunca ninguém filmou junto.

MCB: Não se cruzavam no set?

RC: Não, nunca. Porque na época o sócio deles nesse filme era o Silva Neto, que, na época, namorava com a Gretchen. Para não ter brigas, acho que assim que eles achavam, de repente, mulher dona do filme, a outra não é, qualquer coisa assim, né? E como sempre a mídia fez um envolvimento dizendo que a gente vivia entre tapas e beijos e, na verdade,  a gente não vivia nem entre tapas e nem em beijos, somos colegas de profissão, porém não aquela intimidade toda. Mas desde ali que começou a fazerem esse negócio. Eu acho que, por exemplo, a cena do filme, aquela cena do strip dentro do carro, eu acho que é uma cena que marcou e que muita gente lembra desse filme por ela, acho que marcou muito mais que o filme em si todo foi aquela cena.  Não existia pornografia, era pornochanchada,  não era pornografia,  a cena foi muito bem feita. Acho que eu tenho que dar parabéns para o Deni Cavalcanti, que foi o diretor e que dirigiu aquela cena, que foi muito bem feita.

MCB: Você imaginava que o filme iria fazer aquele sucesso todo que ele fez? 

RC: Não, não imaginava, porque eu achava o filme assim tão de terceira, a produção pequena, era feito no apartamento de um, no carro do outro, era tudo feito assim nas coxas mesmo. Um filme que ele ganhou milhões, ele ganhou muito com esse filme, a gente até diz que ele ficou rico com esse filme e não gastou porra nenhuma, porque o cachê era desse tamanico e não gastou nada. 

MCB: E quando fez o Aluga-se Moças 2 as coisas melhoraram?

RC: Não, continuou a mesma coisa, porque o dois foram feito em seguida. Eu acho que o filme não tinha nem ainda estreado e ele já estava fazendo o dois, porque acho que na visão dele  já sabia que ia ser um sucesso muito grande, foi um sucesso muito grande realmente. 

MCB: E você percebeu que já estava ficando mais à vontade como atriz? Pois você já vinha de  três filmes e mais uma participação em uma peça. A atriz já estava mais segura?

RC: Não, eu sempre fui insegura, até hoje, eu sou insegura. Eu acho assim, a atriz, a cantora, a bailarina, enquanto sentir esse medo é que ela ainda vai subir no palco, no dia que passar esse medo ela não vai subir, não vai ter mais graça. Então nunca me senti segura e até hoje sou insegura mesmo.

MCB: Você é a protagonista, ao lado do Deni Cavalcanti, no O Vale dos Amantes, do Tony Rabatoni

RC: Foi o Deni (que também era o produtor) que me convidou, me chamaram para ser realmente a protagonista da história, se eu aceitava o trabalho. Ficamos três meses filmando, fomos para Santos, só saía para fazer o programa do Chacrinha e voltava. Foi muito legal, esse filme eu acho que posso dizer que curti mais. Acho que faltou uma boa direção de elenco, para comigo, porque eu não era uma atriz, eu ainda não digo que sou uma atriz,  tenho muitas falhas, mas se eu tivesse na época investido em um bom produtor, em um bom diretor de elenco, de ter ficado comigo, de passar comigo as cenas, eu acho que esse teria sido o maior trabalho da minha carreira. Mas está bom.

MCB: Sua  personagem era casada com o do Sérgio Hingst, o engenheiro, que sua personagem traía nas barbas..

RC: Sim, o marido pegou a mulher na boate, né, e a trouxe para casa. No filme eu fazia striptease na boate, foi a primeira vez que eu fiz um strip, nunca tinha feito na minha vida.

MCB: Foi muito difícil?

RC: Foi difícil, foi dificílimo, porque até então eu nunca tinha tirado a roupa total. Foi muito difícil, mas foi muito bonito, acho que foi uma cena muito bonita. Foi um filme em que eu me diverti muito, chorei muito, sofri muito. Naquela cena da cachoeira, eu tive que gravar às 5 horas da manhã, um frio de inverno. Quando vi que tinha que fazer aquela cena eu disse “Ok, beleza, mas eu vou congelar”. E aí disseram “Depois você esquenta rapidinho”. E aí, água gelada, 5, 6 horas... Mas eu sou muito tranquila, eu sou muito calma, sou muito fácil de lidar, pessoas lidam comigo facilmente.

MCB:  Você lança também o disco.

RC: É, aí logo em seguida eu fui gravar o disco. Também não sou cantora, minha voz é pequenininha, é afinadinha, bonitinha, porém eu não sou cantora, cantora é Gal Costa, Fafá de Belém.

MCB: Foi na época que você saiu do Chacrinha, não é isso?

RC: Foi, final de 83 eu sai do Chacrinha, porque eu já tinha gravado o disco, eu tinha contrato de chacrete e tinha contrato de modelo.

MCB: Teve um problema com uma entrevista.

RC: Pois é, fizemos uma entrevista, e no final dela, a entrevista já tinha acabado, a jornalista muito esperta e nós inocentes, ficamos batendo papo. Nisso, uma das meninas falou que na época fazia programa e acabaram dizendo que tinha sido eu que falei. Isso é uma coisa que eu nego, porque se eu falo uma coisa eu assumo que falei, mas ali falaram que eu disse algo que não falei. Teve uma briga com a emissora, que na época era a Globo, que não aceitava esse papo de que tinha menina ali que fazia programa. Acabou que eu levei um puxão de orelha, eram três meses de suspensão, mas eu não aceitei. Exatamente porque não foi eu que falei, se tivesse sido eu estava tudo bem, seria eu falei está feito, mas não fui eu. Não aceitei, briguei e saí fora.

MCB: E a partir daí acabou seu relacionamento com o Chacrinha?

RC: Ficamos um bom tempo sem nos falar, mas aí, antes de ele falecer, a gente se falou. Eu pedi desculpas por tudo, mas continuei dizendo que não fui eu que tinha falado aquilo, então não poderia ter assumido. Logo depois ele faleceu, fiquei muito pra baixo.

MCB: Outro ótimo momento seu no cinema é em Carandiru, do Hector Babenco.

RC: Pois é, eu me apresentava no Carandiru, e me chamaram para fazer o filme. Na época das filmagens eu não podia fazer, mas depois participei, e fiz também outros trabalhos, comecei a aparecer em novela.

MCB: Foi difícil?

RC: Foi legal porque tive diretores maravilhosos. Eu fiz a “Diarista”, que foi ótimo, “Casseta e Planeta”,  ótimo também. Depois fiz participação em novela (“Dona Xepa”), que também foi muito legal, te dão apoio, apoio da direção, do elenco.

MCB: Aquela cena no Carandiru é...

RC: É um respiro no filme, né? 

MCB: Sim.

RC: Exatamente na metade do filme, o que eu achei ótimo. De repente aparece a Rita né, hora em que o público para para pegar fôlego. 

MCB: Você continua fazendo show nos presídios? 

RC: Hoje em dia eu não faço mais, mas não por mim, quero deixar isso bem claro, mas pela secretaria de segurança pública, eles ficam com medo, hoje em dia não temos mais segurança como era antigamente. Eu fazia shows em finais de ano, época de festa, bater papo e conversar. Depois daquele que teve aquela rebelião em São Paulo, que acaba sendo uma rebelião geral no Brasil inteiro, a partir dali eu parei. Eu trabalhei de 84 até o final do Carandiru.

MCB: A cena no filme é ótima.

RC: O filme é baseado no livro do Dráuzio Varela, aquela personagem não podia faltar, pois faz parte da história do Carandiru. Já aquela cena da garrafa eu nunca tinha feito aquilo, confesso que fiquei com medo depois. A cena acabou, eu fui para casa e pensei “Vão me sacrificar, vão acabar comigo, porque vão imaginar que eu fazia aquela cena, pegar a garrafa e botar na boca, boquinha da garrafa, aquela cena de colocar a camisinha na garrafa, vão me crucificar”. Eu fiquei com medo mesmo, mas dessa vez eu acho que o pessoal entendeu, porque é uma coisa que eu mostrei de prevenção, né? 

MCB: E foi um sucesso.

RC: Foi, graças a Deus. É um filme que marcou, um filme que vai ficar marcado, porque digo que daqui uns anos vai virar filme para pesquisa.. 

MCB: E aí tem o documentário sobre a sua vida, Rita Cadillac, A Lady do Povo, do Toni Venturi. Como se deu esse processo?

RC: Ele me procurou, disse que queria conversar , pois queria fazer um filme comigo. Eu então disse tudo bem, que ele poderia ir à minha casa. Daí ele chegou e já foi dizendo que queria fazer um documentário sobre a minha vida, achei que era pegadinha. Respondi “Não sei que vida, não acho que a minha vida dá um documentário”, mas ele disse que eu podia achar que não, mas que dava sim “Vamos fazer um acordo, você não vai esconder nada de mim, ok”. Eu disse que tudo bem, mas não estava botando muita fé não.  Eu não acho minha vida tão assim que mereça um documentário, acho que tem pessoas muito mais importantes do que eu e que merecem um documentário, merece uma homenagem, porque isso para mim é uma homenagem viva. 

MCB: Mas é claro que você merecia.

RC: Olha, eu sou uma pessoa conhecida. Mas eu achei que não merecia aquela homenagem, pois vejo como uma grande homenagem. Porque ainda estou viva, estou trabalhando ainda, e eu sempre via documentários de quem já morreu, entendeu? E eu estou lá, vivinha da silva, inteirinha. Achei muito legal.

MCB: O filme começa com você já  questionando, que ia mostrar a mulher por trás da Rita Cadillac. Há ali uma espontaneidade e uma sinceridade tão grandes que já conquista a gente.  Como foi fazer esse filme?

RC: Foi tranquilo, porque eu sou isso. Eu digo assim: “Existem duas Ritas, a Rita de Cássia e a Rita, Cadillac. A Rita Cadillac é quando eu subo no palco, já a Rita de Cássia é aquela mulher que vai à luta, a mulher que tem filho, a mulher que tem que trabalhar, a mulher que tem que lavar roupa, que tem que cozinhar.

MCB: Você diz isso, inclusive, quando fez o filme pornô, que você só conseguiu fazer porque você se segurou nessa questão da Rita Cadillac, não é isso?

RC: Exatamente isso. Quando eu fui fazer filmes pornôs eu fui contratada “Vamos lá, legal, maravilha, ótimo.” Eu não me esqueço que a primeira cena foi em um dia das mães, eu falei com meu filho “Tchau, a mamãe vai trabalhar, vai fazer um filme”. Foi naturalmente, como se eu estivesse indo fazer Carandiru, normal. Eu fui fazer a cena no carro, tira foto, beijando, maravilha, porque até então era uma coisa sensual, né? Aí veio a diretora e falou “Agora você vai lá e muda de roupa, pois vai começar a cena de sexo”. Aí eu falei “Onde eu estou?”. Ai que está, a ficha caiu. O que realmente eu ia fazer, até então para mim, era aquilo ali, lindo e maravilhoso, e acabou. Como eu tinha feito aquela cena tradicional do carro, vai ser a mesma coisa. Mas aí eu vi que não era aquilo, era de verdade. Aí eu fui honesta, bebi, e falei para o ator “A única coisa que eu te peço é para não falar nenhuma palavra no meu ouvido”.  Eu consegui fazer as cenas. Eu tinha saído da minha casa com uma impressão nada a ver. Depois eu fiquei duas horas debaixo do chuveiro, foi a hora de estar comigo, de segurar a minha onda, senão eu acho que tinha pirado de vez. 

As pessoas viram que o que eu falei foi verdade. Elas viram que não foi para aparecer, para voltar a ter mídia. Porque as pessoas achavam que eu era a Rita Cadillac o tempo inteiro, e não era isso, no dia a dia mesmo.

MCB: E aí tem o filme do Nelson Hoineff sobre o Chacrinha, Alô Alô, Terezinha, que reuniu as chacretes. Você convive com elas?

RC: Eu não convivo. Eu adorei ter feito esse filme do Nelson só por um motivo, porque a gente conseguiu se reencontrar muitos anos desde que eu saí do programa, então eu fiquei contente exatamente por isso, de rever algumas colegas. A gente não convive acho que por falta de tempo. Eu sou uma pessoa que não é metida no meio, acho que é raridade ouvi falar que Rita Cadillac estava em uma festa. Então é muito difícil. Eu vou para festivais de cinema, eu vou lá, falo oi e tchau, e vou embora.

MCB: Nos shows você continua, não é?

RC: Contínuo. Continuo fazendo show,  canto, danço, hoje em dia faço de tudo, só não planto bananeira (rsrsrs).

MCB: Podia ter um convite para você de atriz.

RC: Pois é, quem sabe, assim de repente, não me convidam para fazer um filme. Eu tenho um grande sonho de ter um programa de televisão, não de entrevista, essas coisas assim, mas um programa de televisão de entretenimento para a mulher. Não sou a Ana Maria Braga, mas acho que eu poderia fazer um programa da Ana Maria, mas com todas as outras dicas. Não só de comida, mas de uma mulher sozinha. Às vezes a torneira quebrou e eu não sei consertar, tem que mandar alguém vir, então se você dá uma dica para uma mulher, ensinar a fazer.

MCB: O documentário tem rodado por aí, não é?

RC: Graças a Deus, Festival em Nova York, Miami, Londres, Roma, Montevideo.

MCB: Você gosta de acompanhar?

RC: Adoro, ainda mais viajar,. Adoro viajar, é sempre útil, ir para outros países, conhecer outras culturas, eu acho muito legal. Eu nunca fui à Europa, Estados Unidos eu já tinha ido. Então eu fiquei entusiasmada para chegar em Londres, principalmente em Roma. Já planejei o trajeto para Roma, já está tudo acertado, o que vou fazer, o que vou deixar de fazer. Quando chegar, vou para o festival e vou tirar três dias para viajar na Itália, conhecer a cidade de Monte Castelo, onde começou toda a geração Rita daí.

MCB: As últimas duas perguntas que são fixas do site. Qual ultimo filme brasileiro a que você assistiu? 

RC: O último filme brasileiro a que eu assisti foi Olga  (Jayme Monjardim). Mas foi na TV.

MCB: Eu sempre convido minhas entrevistadas para homenagearem uma mulher do cinema brasileiro, de qualquer época e de qualquer área, para deixar registrada na entrevista. Uma mulher que você admire, brasileira. 

RC: Eu não vou de falar de agora, mas eu vou te falar da minha geração criança,  quando fui ao cinema. Ela se chama Eliana, ela era a rainha das Chanchadas.

MCB: Sim. Me fale um pouco sobre ela. 

RC: A Eliana, acho que foi para mim, assim onde eu posso dizer, que eu conheci a atriz brasileira. Foi por aquelas chanchadas todas que eu comecei a gostar de cinema nacional. Porque o primeiro filme que eu vi na minha vida foi o La Violetera, com Sarita Montiel. Então para mim ela é uma deusa.

MCB: Alguma pergunta que eu não te fiz e que você gostaria de falar aqui no site, já que ele é de registro de memória? 

RC: Eu acho que a única coisa que eu tenho que falar é um muito obrigada de fazer parte desse site sobre mulheres do cinema, mulheres da arte. Então dizer um muito obrigado por achar que eu faço parte desse mundo.

MCB: Acho não, tenho certeza. Muito obrigado Rita.


Entrevista realizada em em agosto de 2010.
Foto: cena de Rita Cadillac, a Lady do Povo (2007), de Toni Venturi

Veja também sobre ela

::Voltar
Sala 
 Sala Dina Sfat
Atriz intensa nas telas e de personalidade forte, com falas polêmicas.