Ano 20

Zita Carvalhosa

Zita Carvalhosa é um nome obrigatório quando se quer falar de cinema brasileiro dos anos 1980 para cá. Foi nesta época, que Zita Carvalhosa criou programação fixa de curtas no MIS, contribuindo para dar visibilidade ao formato, criando o programa "Curtas Inéditos" e depois a mostra de sucesso “80 curtas dos anos 80”. Estava aí o embrião para o evento mais importante do formato, o “Festival Internacional de Curtas-Metragens de São Paulo”, que teve início em 1990. “Nessa época, eu estava trabalhando, em paralelo à produtora, como curadora do cinema do Museu da Imagem e do Som de São Paulo. A gente resolveu definir uma atividade permanente de divulgação do curta-metragem, que, no final dos anos 80, estava com uma força muito grande. Aí nasce o Festival de Curtas”.

Zita Carvalhosa é também sócia da Superfilmes, produtora que esteve à frente de filmes importantes como os longas Anjos da noite (1987), de Wilson Barros, e Capitalismo selvagem (1993), de André Klotzel, e os curtas Amor (1994), de José Roberto Torero, e A mulher do atirador de facas (1984), de Nilson Villas Boas, além de muitos outros. “Quando eu fui convidada para ser sócia da SuperFilmes junto com André Klotzel, Pedro Farkas, José Roberto Elias e Ricardo Dias, nós éramos cinco. Eu era um pouquinho mais nova que eles. Eu sempre brinco que eu pegava muito no batente”.

Como a realidade para produtores, pesquisadores e amantes do cinema brasileiro, a preservação e restauração dos filmes é uma preocupação constante. “E pensar que toda essa produção dos anos 80 nunca foi bem cuidada, porque ela era muito nova quando desmontou tudo, e era velha quando foi retomado os procedimentos básicos de preservação. Então a gente tem uma produção muito mais cuidada dos anos 60 e 70 do que dos anos 80. Eu acho que temos que ter, enfim, programas e atitudes nesse sentido, precisamos restaurar estes filmes”.

Zita Carvalhosa esteve na 14a Mostra de Cinema de Tiradentes para o lançamento do “Guia Festivais de Cinema e Vídeo”. A importante produtora conversou com o site Mulheres do Cinema Brasileiro e falou sobre sua trajetória: os filmes produzidos, o Cinema Paulista dos Anos 80, o Festival Internacional de Curtas-metragens de São Paulo, a preservação de filmes, e muito mais.



Mulheres do Cinema Brasileiro: É impossível falar em produção e difusão de curta metragem sem falar em Zita Carvalhosa, além da produção e da organização de festivais. Vamos falar um pouco sobre sua formação e esse início da trajetória?

Zita Carvalhosa: Na verdade, eu sou formada na França, em Cinema, me formei no início dos anos 1990. E aí tive o privilégio de ser convidada para formar uma produtora, que é a Superfilmes, em 1983, com um pessoal que estava saindo da USP, na função de produtora, que é a função que eu exerço até hoje em todas as atividades que eu faço. Eu não comecei direto no curta metragem não, quer dizer, o primeiro filme que eu trabalhei foi um longa, A Marvada Carne (André Klotzel). Depois eu fiz Anjos da Noite (Wilson Barros), e daí, enfim, começaram a me chamar para produzir curtas Produzi o A Garota das Telas, do Cao Hamburger e comecei a fazer curtas. 

No final dos anos 80, eu já tinha produzido uma certa quantidade de curtas, como A Mulher do Atirador de Facas (Nelson Villas Boas), curtas que, naquela época, iam para o cinema A gente teve um pouco dessa crise da legislação, quer dizer, a desmonte do cinema brasileiro em que se perdeu esse espaço. Nessa época, eu estava trabalhando, em paralelo à produtora, como curadora do cinema do Museu da Imagem e do Som de São Paulo. A gente resolveu definir uma atividade permanente de divulgação do curta-metragem, que, no final dos anos 80, estava com uma força muito grande. Aí nasce o Festival de Curtas. Nasce primeiro um programa que se chamava “Curtas Inéditos”, que era uma vez por mês, passava uma semana de curtas inéditos. Depois, a gente criou o “Os 80 Curtas dos Anos 80”, uma mostra que é precursora do Festival de Curtas. E em 90, a gente abre para o Festival de Curtas, vai fazer 21 anos.

MCB: Gostaria que você recuperasse a Superfilmes, que é um momento importante daquele novo cinema paulista ali, com o André Klotzel, Wilson Barros, Chico Botelho…

ZC: Quando eu fui convidada para ser sócia da SuperFilmes junto com André Klotzel, Pedro Farkas, José Roberto Elias e Ricardo Dias, nós éramos cinco. Eu era um pouquinho mais nova que eles. Eu sempre brinco que eu pegava muito no batente. Eu sempre fui produtora, o André e o Ricardo realizavam e produziam também um pouco, o Pedro e o Zé eram fotógrafos. Nos anos 80, a gente estava na época do Novo Cinema Paulista, tem até uma foto histórica em que eu estou. Foi um momento muito forte, a gente teve um edital dentro da Embrafilme, uma parceria junto com a Secretaria do Estado da Cultura, em que foi produzido o Anjos da Noite, o Vera (Sérgio Toledo), o Feliz Ano Velho (Roberto Gervitz). Então foi um momento muito rico e, no final desse momento bastante saboroso do cinema, nossos filmes estavam na tela, o Marvada Carne, que é uma produção da Superfilmes também. A Superfilmes não existia quando a gente ganhou o edital, mas o Superfilmes era a produtora junto com a Tatu Filmes. Fizemos mais de um milhão de espectadores, e ter o gosto de fazer mais de um milhão de espectadores com um filme de estreia da produtora e ir a Cannes foi uma experiência muito bacana.

MCB: Além de ser um clássico.

ZC: Um clássico. Depois a gente fez o Anjos da Noite, que eu também acho que é um filme marco, um filme moderno, um filme que estava antes da época dele, um filme de diversidade, de pluralismo sexual que não estava ainda nas telas, naquele momento, com aquela força. Esses são os dois filmes mais importantes dos anos 80 da Superfilmes. Em 90, eu ainda produzi O Beijo 2348/72, do Valter Rogério, mas isso como produtora convidada pela Embrafilme para finalizar o filme. Depois desse momento, que estava tudo funcionando, teve esse buraco do Cinema Brasileiro. Eu digo que tive a sorte de ser uma produtora de curtas metragens e tive a sorte de estar trabalhando no Museu da Imagem e do Som, de fazer uma política acertada de difusão desse cinema de curta metragem.

MCB: Eu acho que o escritório era até dividido entre produtoras, não era isso?

ZC: Então, a Superfilmes dividia escritório com o Chico Botelho, que era a Orion, com a Maria Ionescu. A Tatu Filmes era do lado, tinha o cinema da Vila Madalena, um grupo de pessoas que tinham uma cumplicidade bastante grande. Se você pensar, tinha um grupo todo que, enfim, funcionava junto e criou uma cumplicidade que existe até hoje, um grupo de pessoas que chegaram no cinema ao mesmo tempo.

MCB: E aquela definição chamada de Cinema Neon. Como você vê isso?

ZC: Dois sócios eram fotógrafos, foi um cinema que foi muito fascinado pela fotografia, pela imagem. Tem gente que diz a “Ditadura da Fotografia”. Chegaram novos equipamentos, havia desafios estéticos, estávamos saindo de uma década de um cinema um pouco mais comercial. Então tinha uma questão de um cinema de ideias, umas ideias realizadas com boa técnica e linguagens cinematográficas. Eu acho que era um trabalho que desenvolveu bastante bem. A gente até diz que não pôde ver os resultados imediatos, porque teve um hiato, e eu acho que essa geração dos anos 80 sofreu muito com esse hiato, pois estava todo mundo a mil por hora quando baixamos a guarda, quer dizer, ficamos quase quatro anos sem atividade.

MCB: Mas você concorda com essa definição de Cinema Neon?

ZC: Não. A história é a seguinte. Quando você revê esses filmes, eles são muito marcados. A Marvada Carne, por exemplo, não, mas Anjos da Noite, Cidade Oculta, Vera, mesmo Feliz Ano Velho, são filmes em que você vê uma identidade. Se essa identidade é neon eu não sei se essa é a palavra que eu usaria porque eu não gosto muito de neon. Eu acho que esse cinema teve o seu papel, era um cinema muito mais urbano, era um cinema que estava falando de uma geração que estava falando de si mesma naquele momento. Era um cinema, no nosso caso paulista, forte. Quer dizer, é um cinema que talvez não seja um cinema paulista, mas você tinha filme do Rio Grande do Sul com cara do Rio Grande do Sul, filme no Rio de Janeiro com um cara do Rio de Janeiro, então, sabe, tinha uma ideia de retratar os diferentes brasis não um Brasil, que também era interessante. Eu era bastante jovem nesse momento, então eu acho que eu tive esse privilégio de ter vivido essa época da Embrafilme, de gestão de política da Embrafilme, de prestar contas. De fazer, ao mesmo tempo que a gente batalhava pela Lei do Curta, conseguimos a regulamentação, isso tudo nos anos 80, um momento de muitas batalhas e muitas conquistas.

Quando a gente entra nos anos 90 é aquele susto. Tínhamos acabado de encomendar uma cópia do filme do Walter Rogério para mandar para um festival. Naquela época, você tinha que mandar uma cópia para tentar marcar uma projeção. Daí a Embrafilme fechou no dia 15 de março, a gente não conseguiu pagar a cópia, não conseguiu tirar do laboratório, não conseguiu mandar, entendeu?  Ser impedido no final de um processo por uma coisa absolutamente burocrática.

MCB: Foi terra arrasada.

ZC: Terra arrasada, foi zero. Nos anos 90, a gente começa a rearticular essa atividade, e daí é que eu entro um pouco nesse viés curta metragem, por ter sido uma produtora de curtas metragem, por ter defendido essa bandeira já no Museu da Imagem e do Som antes do desmonte. E o Festival de Curtas funciona, funciona muito bem, entendeu, ele começa.

MCB: Em que ano começa o Festival de Curtas?

ZC: 90.

MCB: 90 mesmo?

ZC: 90 mesmo, a primeira edição. O Festival acontecia só no Museu da Imagem e do Som, apresentamos uma mostra, tinha dois convidados internacionais, era uma seleção dos curtas que tinham passado em Gramado, a gente acontecia logo após Gramado. A gente encheu a sala do Museu, que tinha 180 lugares, as pessoas gostaram muito, mas era um festival pequenino. No ano seguinte, já abriu inscrições, e por dez anos a gente apresentou todos os curtas produzidos, não tinha seleção. Então ele foi crescendo porque a produção começou a crescer de novo, ela estava praticamente zero e começou a crescer de novo. A gente só apresentava coisa em cinema, era uma mostra de cinema. No final, no início dos anos 2000, entramos com o vídeo porque a produção de audiovisual brasileira não estava mais só no cinema, mas durante muito tempo a gente conseguiu exibir tudo que era produzido.

MCB: E têm muitos nomes que são frutos especificamente desse momento, não é isso?

ZC: É, eu acredito que sim. O primeiro curta da Lucrécia Martel veio ao Festival, Beto Brant e Roberto Moreira começaram no festival. O Walter Salles não veio, já tinha feito antes, mas veio com o Socorro Nobre no festival. Tata Amaral, Francisco César Filho e Jorge Furtado participam do Festival. Depois vem o Kleber Mendonça, Karin Aiñouz teve seu primeiro filme exibido no Festival. Enfim, o Festival é um lugar importante, não era competitivo e exibia uma pluralidade, ele não tem uma linha curatorial, não que eu critique isso, mas, quer dizer, ele se pretende como panorama, entendeu? Ele se pretende com as diferentes vozes do cinema, do audiovisual brasileiro em cada ano. Eram 416 filmes, sendo que tinha 260 brasileiros, é bastante.

MCB: Ele foi aumentando a cada edição?

ZC: Não, já faz uns cinco anos que ele está com 400 filmes, a gente não deixa aumentar.

MCB: Digo do surgimento pra cá

ZC: Ele só cresceu. E cresceu também em termos de atividade, ele começou simplesmente como festival de cinema, depois, faz 10 anos já, o festival faz as oficinas no Fórum, um modelo, é um padrão de formação no momento que isso ainda não existia tanto. Hoje em dia existem muitas oficinas de inclusão audiovisual, no Fórum foi uma das primeiras, a gente faz essa mostra que se chama Formação do Olhar. É um nome um pouco até questionável, mas que era a ideia dessa produção de oficinas, onde ela ia, de onde ela vinha. No primeiro ano, a gente não conseguia fechar uma mostra de tão poucos filmes que tinha, hoje em dia tem que fazer seleção, tem premiação para esse setor, é uma tentativa um pouco de abarcar vários públicos.

MCB: Como surge o Fórum?

ZC:  O Fórum surgiu para sustentar o Festival, ele surgiu porque o festival era uma atividade interna do Museu da Imagem e do Som e precisava crescer. Na ocasião, a gente pediu autorização para sair do museu como atividade do museu, o Museu e a Secretaria da Cultura são parceiros do evento até hoje. Eu me habilitei em uma lei de incentivo de São Paulo, que era a Lei Mendonça, no meu nome de pessoa física, e fizemos dois, três anos assim. Daí, eu achei que estava ficando um pouco grande para estar em uma pessoa física e a gente assinou um convênio com a Prefeitura, que exigia uma entidade sem fins lucrativos, então criamos o Fórum a partir de uma necessidade do Festival.

MCB: Que foi quando?

ZC: Foi em 1995, mas logo o Fórum deixou de ser só o festival. Quer dizer, hoje em dia no Fórum tem oficinas, é ponto de cultura, faz o Festival de Tela Digital, tem o site, tem uma ação grande com as universidades, tem bastante gente envolvida.

MCB: No campo da produção, são muitas as mulheres atuantes.

ZC: Sim. muitas produtoras mulheres. Por que tem muitas produtoras mulheres? Bom, aí você pode ter duas linhas de pensamento. Você pode dizer que é uma atividade menor e nós mulheres sempre fazemos coisas menores, o que eu acho um caminho errado. Ou você pode dizer que existem sensibilidades diferentes e as mulheres conseguem fazer várias coisas ao mesmo tempo, é uma característica do gênero. O produtor, no fundo, faz várias coisas ao mesmo tempo. Então, às vezes, eu penso isso, porque esse sucesso do gênero feminino na produção seja, talvez, por essa sensibilidade de pensar duas coisas ao mesmo tempo. Tem produtores homens maravilhosos também, então eu não acho que seja uma divisão de sexo, o que eu acho que é importante, quer dizer, com essas novas estruturas de produção, é que a gente acabou com aquele produtor que era simplesmente um assinador de cheque burocrático. Hoje você tem que ter uma inteligência criativa para conseguir produzir um filme, viabilizar financiamento, botar a melhor equipe junta, criar. Eu acho que essa conversa entre produtor e diretor é que viabiliza essa unicidade do produto. Eu acho que cada filme é um filme, você concatenar para fazer aquele filme é uma parceria entre produção e direção.

MCB: Me ensina um pouco sobre os diferentes tipos de produtor.

ZC: Olha, no Brasil tem umas nomenclaturas que se misturam um pouco, quer dizer, a gente chama aqui de produtor executivo, às vezes, o produtor do filme mesmo. Na verdade, eu estou pra ver quem bota do seu dinheiro para produzir filme. O produtor, na verdade, é quem organiza essa economia do filme para ele se viabilizar, e não necessariamente do seu bolso. No Brasil é chamado de produtor executivo, mas não, é uma mistura, porque eu acho que essa pessoa é o produtor. Às vezes, você tem um produtor e ele chama alguém para organizar a filmagem como produtor executivo, daí é praticamente uma função técnica, entendeu? Eu acho que as nomenclaturas se misturam, quer dizer, não temos essa clareza. Daí você tem o diretor de produção, e você pode ter o diretor de produção com funções executivas, como fazer negociações, acertar cachês. Ou você pode ter um diretor de produção que é mais um produtor de campo. Cada filme é chamado de uma maneira. Então eu não acho que quando a pessoa diz você é produtora, eu sou produtora executiva desse guia. Eu que pensei o guia quando ele surgiu, eu que arrumo dinheiro para o guia.


MCB: No cinema, são muito as mulheres produtoras importantes, Lucy Barreto, Sara Silveira, Assunção Hernandes, Gláucia Camargos, Maria Ionescu, e tantas outras. Vocês convivem?

ZC: São muitas.  Acho que essa também é uma qualidade feminina, a gente gosta de trabalhar em grupo. Então eu acho que tem muita troca de informação, eu poderia elencar um grande número de mulheres que estão produzindo e que estão trocando experiências. Quando dividimos uma sala, eu, Sara e a Maria, a Superfilmes e a Orion, trocamos muito. A Sara é uma das maiores produtoras, quando eu tenho uma dúvida eu pergunto para a Sara, e quando ela quer saber alguma coisa ela pergunta para mim, a Maria liga para mim. Enfim, tem muitas e muita gente boa chegando.

MCB: Agora eu vou te fazer uma pergunta polêmica, pois você tocou nisso indiretamente duas vezes; você acredita em olhar feminino no cinema?

ZC: Eu acredito. Quer dizer, eu não sei se acredito em olhar feminino, mas eu acredito em uma sensibilidade de gênero. Quer dizer, o feminino não precisa ser necessariamente ligado a uma mulher, entendeu, mas eu acho que existe.  A gente vê uma Sofia Coppola, por exemplo. Qual a formação dela? Eu não tenho menor ideia como é que ela fala, não conheço, não sei o quanto de mulher ela está botando nisso, mas se você ver filme dela… Ou quando vê um filme da Tata Amaral… Às vezes você vê filme de mulheres que não necessariamente tem este olhar, e as vezes você vê em filme de homens que você fala “Nossa, que sensibilidade feminina”.

MCB:  Um Walter Lima Jr, por exemplo?

ZC: Por exemplo. Então eu acredito nas diferenças, eu acho que a gente tem que valorizar as diferenças para chegar à igualdade. Eu não acredito nessa coisa de que não tem diferença, eu acredito que tenha diferença sim.

MCB:  Eu entrevistei a Maria Ionescu e ela me falou da precariedade das cópias do Cidade Oculta e do Janete, deteriorando. Como produtora você deve sofrer também com isso, não é?

ZC: Olha, eu acho que isso é uma coisa perigosíssima. Eu me lembro que o primeiro Festival de Brasília que eu fui o Janete estava passando, é um filme sensacional. E pensar que toda essa produção dos anos 80 nunca foi bem cuidada, porque ela era muito nova quando desmontou tudo, e era velha quando foi retomado os procedimentos básicos de preservação. Então a gente tem uma produção muito mais cuidada dos anos 60 e 70 do que dos anos 80. Eu acho que temos que ter, enfim, programas e atitudes nesse sentido, precisamos restaurar estes filmes, precisamos ver se está tudo no internegativo, se está tudo no negativo, muita gente usa o negativo para poder fazer cópia e não faz internegativo, acontece porque tem pouco dinheiro.  Você tem curtas-metragens sensacionais que estão se perdendo.

MCB: E dos longas que você produziu, tem algum restaurado?

 ZC: Não, ainda nenhum. Eu produzi muitos documentários, eu gosto muito de documentário, e a gente, enfim, tomou alguns cuidados. Eu não diria que eles estão todos preservadíssimos, mas eles não estão em situação de risco. Na Retomada do cinema brasileiro a gente produziu o No Rio das Amazonas, do Ricardo Dias. Ganhamos um prêmio no Festival de Brasília, foi um dos primeiros longas metragens em documentário que saiu em uma sala de cinema.

MCB: Gosto muito do filme.

ZC: O filme é lindo, abriu também um caminho para, hoje em dia, a gente ter muitos documentários em sala de cinema. Naquela época diziam “Mas é uma loucura, uma loucura!”.  Do Ricardo, produziu No Rio das Amazonas e Um Homem de Moral, eu gosto bastante dos filmes. Do Evaldo Mocarzel, eu produzi o À Margem do Concreto, Jardim Ângela e Cinema de Guerrilha, eu gosto também, eu gosto especialmente muito do À Margem do Concreto, acho que é um filme muito, muito especial. Eu produzi vários documentários do Chico Teixeira, o Criaturas que nasciam em segredo, que é um bonito filme; o Urbânia, do Flávio Frederico, que é um misto de documentário e ficção. Eu gosto de primeiros filmes, primeiros longas, então eu produzi o primeiro da Lina Chamie, Tônica Dominante; o primeiro do Chico Teixeira, A Casa de Alice; o primeiro filme do José Roberto Torero, Como Fazer um Filme de Amor; o primeiro do Wilson Barros, Anjos da Noite.  É uma carteira que eu gosto, é um investimento que vale a pena, acho que pode correr mais riscos no primeiro filme. Na Superfilmes, a gente produziu muito com pouco dinheiro, temos um pouco essa marca. Você tem um filme na tela que parece muito mais do que ele custou, por uma maneira de produzir, que valoriza essas parcerias de autores que viabilizam os primeiros filmes.

CB: Como você vê, atualmente, a presença da mulher no cinema brasileiro, em suas diferentes áreas?

ZC: Eu acho que a mulher ganhou muito espaço no Brasil como um todo, não é uma característica só do audiovisual. Esse espaço e esse trabalho passaram a ser reconhecidos e visualizados. Tem mais gente trabalhando em funções criativas, produzindo, protagonizando.

MCB: Para terminar, as duas últimas perguntas fixas do site: qual foi o último filme brasileiro a que você assistiu?

ZC: Eu assisti ao filme da Eliane Caffé, O Sol do Meio Dia.

MCB: E qual a mulher do cinema brasileiro, de qualquer época e de qualquer área, você deixa registrada na sua entrevista como uma homenagem.

ZC: Ai meu Deus, deixa eu pensar… Eu penso na Edna Fujii. Eu a acho uma mulher batalhadora do cinema brasileiro. Sempre nos bastidores, apoiando todos os festivais, apoiando realizador novo, apoiando gente bacana sem um protagonismo evidente, mas com essa força. Você sente a diferença onde ela põe a mão, trabalhou tantos anos na Quanta, um grande parceiro do cinema brasileiro.

MCB: Muito obrigado pela entrevista.


Entrevista realizada em janeiro de 2011, durante a 14a Mostra de Cinema de Tiradentes.
Foto: Paulo Filho/Universo Produção

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Sala 
 Sala Dina Sfat
Atriz intensa nas telas e de personalidade forte, com falas polêmicas.