Ano 20

Yara de Novaes

Com atuação no teatro e no cinema, Yara de Novaes é uma das maiores atrizes de sua geração. Ela começou a carreira no Teatro e é nos palcos que vai desenvolver a maior parte de sua trajetória artística premiada e de grande impacto, atuando em grupos como Encena, Odeon e Grupo 3 de Teatro, em espetáculos importantes como “A Lira dos 20 Anos”, "O Beijo no Asfalto”, “Ricardo III” e “Contrações”. 

A estreia no cinema se dá com o cineasta Rafael Conde, de quem se tornará grande parceira, seja como preparadora de elenco ou como atriz. "O Rafael foi diretor do programa de entrevistas do Fernando (Rocha), que foi meu marido, na TV Minas. Ali, eu acho, que a gente começou a se aproximar. Eu fiz preparação de ator da Débora (Falabella) no curta Françoise, cheguei também a fazer um pouco de preparação para o curta A hora vagabunda. Eu costumo dizer que eu imito o Rafael, verdade, esse texto, por exemplo, foi ele que descobriu o autor. O Rafa é meio um farol para mim, eu aprendi demais com ele, ele é um cara que sabe das coisas".

Yara de Novaes protagoniza o primeiro longa de Conde, o divertido, anárquico e inteligente Samba canção. O Samba canção foi uma delícia, era ótimo. Estava em casa, era divertido, gostava de tudo, gostava do texto, gostava da personagem. Essa paixão que a personagem tinha pelo cinema, como que ela fazia de tudo, ela foi capaz de matar e criar fórmulas para conseguir um filme". 

A atriz é protagonista do belo curta Doce segredo de Bárbara, dirigido pelo cineasta mineiro Paulo Augusto Gomes, que retomou um projeto depois de 20 anos. "Eu falei “Paulo, que projeto maravilhoso” Você poder retomar algo, que beleza, e de uma maneira tão dialética, tão interessante. E com um resultado muito bonito".


Yara de Novaes conversou com o Mulheres do Cinema Brasileiro durante a temporada do espetáculo "Contrações", no CCBB BH,  e repassou sua trajetória: a formação, os trabalhos no teatro, a parceria com a atriz e amiga Débora Falabella, a chegada no cinema, a relação com o cineasta Rafael Conde, e muito mais.



Mulheres do Cinema Brasileiro: Para começarmos, seu nome, cidade onde nasceu, data de nascimento e formação.

Yara de Novaes: Eu me chamo Yara de Novaes, eu nasci em Belo Horizonte, em 25
de agosto de 1966, em plena ditadura militar. Eu fiz Letras.

MCB: Sua primeira formação é em Letras porque você não tinha antes a ideia de ser atriz?

YN: Não tinha curso, a ideia eu já tinha há muito tempo. Eu comecei a fazer teatro aos 15 anos de idade, me matriculei na Oficina de Teatro do Pedro Paulo Cava em 1992, ganhei dele uma bolsa de estudos porque não tinha grana para pagar, então pagava meia bolsa, quem conseguiu para mim foi minha irmã Denise Gomes, que é amiga do Pedro. Então desde 82 eu já queria ser atriz mesmo. Eu me lembro que em uma roda de teatro, na primeira roda de apresentação, era uma turma de adolescentes, muitas pessoas diziam que estavam ali, sei lá, por timidez, uma série de coisas e motivos, e eu fui a única na roda que disse que queria ser atriz, para mim era muito claro que essa era a minha profissão. Não havia curso superior de teatro, muito tardiamente que veio para cá. Tinha o curso do Palácio das Artes e o do TU (Teatro Universitário), eram dois cursos profissionalizantes, eu não podia entrar porque eu tinha 15 anos.

MCB: Sua estreia profissional foi quando? Qual espetáculo e em que ano?

YN: Foi com “Cigarras e Formigas”, em 1983.

MCB: Direção de quem?

YN: Do Afonso Drummond, eu fazia a Dona Cigarra, eu conheci nessa época a Inês Peixoto e o Amauri Reis, que eram meus colegas de elenco. Foi maravilhoso, eu já
Estreei muito bem, eu me lembro que era um sucesso. Uma direção muito elaborada do Afonso Drummond, muito inovadora, me lembro que o cenário era de um arquiteto também muito jovem daqui. Foi uma estreia muito feliz, com companheiros de cena também muito instrutivos.

MCB: Você tem uma carreira importante no teatro aqui em Belo Horizonte e ligada a
grupos.  Tem o Encena, tem a Odeon, mas antes você faz alguns individuais, você faz “A Lira dos 20 anos”.

YN: “A Lira” é com o Encena, o Wilsinho (Wilson Oliveira) foi da mesma época que eu no Pedro Paulo, só que o Wilsinho é um pouco mais velho e ele era da turma da noite. Ele era aluno do Pedro Paulo e eu era aluna da Mamélia Dornelles. Logo depois do “Cigarras e Formigas”, a gente chegou a montar um pequeno grupo, pois queríamos fazer um trabalho juntos, um texto do falecido Flávio Marcio, que acabou não rolando Esse grupo tinha Wilson Oliveira, Evandro Rogers, Guilherme Marques. Depois a gente montou “A Lira dos 20 Anos”, acho que o Wilsinho tinha visto este espetáculo em São Paulo, eu não me lembro, e aí ele foi juntando as pessoas, que eram os jovens atores que saíram do Palácio ou da própria Oficina. O Wilsinho é um grande desbravador nesse sentido, foi ele que, talvez, tenha injetado em nós a certeza de que ter um grupo de teatro é uma saída para a profissionalização e também para a ratificação da sua escolha profissional aqui no Brasil, acho que no mundo inteiro.

MCB: E já era o Encena?

YN: Já era, quer dizer, se tornou o Encena depois, mas “A Lira dos 20 Anos” foi o
primeiro espetáculo do Encena.

MCB: E aí tem um outro memorável espetáculo, que é o “O Beijo no Asfalto”.

YN: O “O Beijo no Asfalto” já foi o último espetáculo que eu fiz com Encena, então a gente pega o primeiro e o último. Nesse meio tempo, eu fiz algumas coisas muito legais, que foram o “Trivial Simples”, um texto muito interessante, do Nelson Xavier, com direção do Wilson, eu fiz grávida, até oito meses de gravidez, com o Gustavo Werneck. Fiz “Mão na Luva” com o Wilson, que era com o Luiz Arthur, foi aí que eu conheci o Luiz Arthur, ele tinha acabado de sair do Palácio das Artes. Foi uma surpresa maravilhosa, como o Luiz Arthur é bom ator, como foi bom foi conhecê-lo tão jovem, tão elaborado, tão bem formado, tão inspirado, intuitivo, foi assim impactante naquela época. Fiz muitas coisas lá no Encena e foi lá também que eu comecei a minha aproximação com a direção, porque eu fiz algumas assistências de direção do Wilsinho, como do “Inimigo de Classe”, um texto maravilhoso que eu tenho a sensação que ele foi feito antes do tempo.

O Encena foi um núcleo formativo muito importante para mim, porque lá, como era um grupo, eu tive que ter muitos braços, ia por muitos lugares, não só o da atuação, e isso dá a certeza, talvez revela qual é o caráter dessa escolha profissional de ser ator e ser ator no Brasil. Você realmente tem que ser um trabalhador braçal se você quiser ter autoria do seu trabalho, se você quiser estruturar o seu trabalho a partir daquilo que você acredita, aquilo que você professa. É preciso que você tenha liberdade e em um grupo, apesar de ser um coletivo e ali ter as suas diferenças e suas fantasias, é o lugar que você vai se experimentar como artista, e aí é uma experimentação que prevê e gosta do erro. Então você não entende a sua trajetória como um único espetáculo, algo que precise ser executado, que precise dar certo, você tem sua trajetória como uma linha mais histórica, o grupo te faz entender assim. Toda vez que eu vou falar eu vou lembrando assim pelos lugares onde eu passei e aí vejo como isso tudo é constituidor do que eu sou hoje.

MCB: A realidade de grupo é nacional, tem grupo em todos os estados, mas é uma
Característica muito forte de Belo Horizonte e de São Paulo, os dois lugares onde você transita.

YN: E em Recife, que eu fui também, Pernambuco tem muito grupo de teatro também.

MCB: Eu citei o “O Beijo no Asfalto” porque aqui em Belo Horizonte ele é uma montagem histórica.

YN: O “O Beijo” é como se fosse um espetáculo exemplar assim do ponto de vista do teatro, tinha um trabalho de ator muito bom ali, de atores maravilhosos, Gustavo Werneck. Hoje eu me encontro com alguns atores que estavam começando a fazer teatro naquela época e eles relatam como foi bom ver o “O Beijo” e como isso refez ou deu a certeza para eles de uma escolha profissional também, muitos atores falam isso.

MCB: Você faz um trabalho importante também na Odeon.

YN: Fiz também.

MCB: Eu assisti o “Coordenador”.

YN: “Coordenador”, “Ricardo III”.

MCB: “Ricardo III” eu também vi.

YN: “Ricardo III” foi o primeiro. Eu tenho um grande amigo, um irmão, que é o Carlos Gradim. Eu tinha muita vontade, assim, que eu pudesse romper essa clausura, essa coisa geográfica de ficar aqui, eu tinha muita vontade. Eu só tinha experimentado isso uma vez, que foi com o Jota D`Angelo, quando eu fiz uma substituição em “Noel, Feitiço da Vila”, foi pelo projeto Mambembão e aí a gente foi para o Rio e São Paulo. Eu nunca tinha experimentado isso de sair daqui, de entender que o que eu fazia aqui poderia ser compartilhado, comungado, mostrado, trocado em outros lugares, em outras praças. Eu tive uma experiência no Encena que a gente viajou para um Festival internacional, foi maravilhoso, mas ficou por aí. Na época, eu tive uma grande frustração pelo “Beijo” não ir e a gente não conseguiu por uma série de coisas. Eu acho que, talvez, uma das prerrogativas da Odeon era exatamente ir para fora, a gente conseguiu viabilizar assim, não era uma diáspora, porque depois que aconteceu isso comigo e com o Carlinhos a gente foi embora depois, mas que a gente pudesse cumprir mesmo uma vocação do teatro que é ir de lugar a lugar, viajar, ir para outras praças, ver outras paisagens, respirar outros ares, mudar o ponto de vista. Com a Odeon a gente conseguiu já com o “Ricardo III”.

MCB: Você especializou mais o lado da diretora, não é isso? O “Ricardo III” já é sua direção, não é?

YN: É. O “Ricardo III” a gente estreou aqui, fomos chamados para o Festival de
Curitiba, que estava no seu auge, e uma olheira do SESC já nos levou para fazer o SESC. Foi a hora que esses horizontes começaram a se abrir, a gente mudar um pouco o ponto de vista e isso foi muito importante. Acho que a Odeon tem essa característica, a gente fez coisas maravilhosas. Eu acho que além desse rigor, que, de alguma maneira, atravessa o meu trabalho na escolha do texto, a busca de uma linguagem, não necessariamente o que é bom ou ruim, mas pelo menos a busca de algo que me traduzisse naquele momento ou que pelo menos eu pudesse fazer conexões com coisas que eu tivesse visto e tudo mais. Que talvez já fosse um traço que eu dei do Encena, até essa paixão pelo texto que o Wilson sempre teve. Um trabalho maravilhoso com texto e ator e que eu aprendi ali. Além disso, eu acho que a outra prerrogativa era a de não ficar só aqui, poder ir para outros lugares e ali a gente conseguiu.

MCB: Antes de a gente entrar no seu grupo atual, aqui em Belo Horizonte, especificamente, tem, na minha opinião, um grupo de atrizes que são muito modernas no sentido de muito urbanas, não tem essa questão do mineirês. Você, Bete Coelho, Mônica Ribeiro, Samira Ávila, Cristina Antuña. Então muitas vezes o seu lado atriz nos palcos faz falta para o público.

YN: Acho que foi uma circunstância mesmo, eu comecei a dirigir, eu fui pra São Paulo e fui chamada para muitas direções, acabei fazendo e gostei disso. Acho que a direção foi também um lugar que me assinou positivamente no teatro em todos os sentidos, eu fui bem aceita pelo público, pela crítica, e isso em São Paulo. Eu fui compreendida em São Paulo primeiro como diretora, ao contrário daqui, né, eu saí daqui mais atriz. Talvez tenha
solidificado o meu trabalho como diretora em São Paulo. A primeira vez que eu viajei para São Paulo foi como diretora com o “Ricardo III”, ou seja, a minha história com São Paulo está muito ligada à direção. Talvez não tenha ido para a televisão um pouco por isso também, não sei, eu gosto de fazer o que eu quero falar. Chegou em um determinado momento que era preciso que eu fosse também uma porta voz de mim mesmo, sabe, eu não queria muito ficar à mercê assim da palavra e do discurso do outro Quando eu fui para o Recife eu não iria trabalhar como atriz, eu cheguei a fazer algumas oficinas e Workshops lá, mas comecei a dar aula. Eu acho que a direção tem um pouco a ver com meu caminho também como professora, eu comecei a dar aula lá na Federal, no curso de Artes Cênicas.

MCB: Você se lembra quando foi e quanto tempo você ficou?

YN: Acho que comecei a dar aula em 2002, ou 2001.

MCB: E ficou quanto tempo em Recife?

YN: Fiquei até 2003. Eu cheguei em Recife em 2000, comecei a dar aula em 2001, 2002, eu conheci alguns atores muito legais lá, muito jovens. E aí fui chamada para dirigir um Albee, “A História do Jardim Zoológico”, a gente conseguiu viabilizar e ganhamos um prêmio lá no Festival de Recife. Ali, talvez, seja o momento de maior divisão no meu trabalho como diretora, como eu tinha muito tempo lá e eles eram realmente atores de muita experimentação, de muita prospecção e dispostos a essa prospecções e experimentações, talvez ali eu tenha começado a intuir de fato um tipo de sistematização para o meu trabalho. Talvez ali eu tenha começado a entender que tipo de direção eu fazia com eles e gostei, comecei a me sentir tão livre como eu me sentia em cena. Ainda te confesso que o lugar de maior liberdade que eu tenho é como atriz, eu estou em casa, eu adoro. Eu estou ali e fico realmente em um estado de presença tão grande que é um mundo à parte. E se você consegue, em qualquer trabalho que você faça, esse estado de total presença, é ali o seu lugar. Na direção, no início eu não tinha e depois comecei a ter também assim o meu gozo, se não era um gozo na relação direta com a plateia, era através da cena, das coisas.  E também ali era um lugar que eu também tinha uma voz muito clara e uma paixão muito grande pelos atores, eu tenho uma paixão e um amor supremo pelos atores, eu amo atores, sobretudo atrizes. É engraçado porque eu sempre sou procurada por atrizes, eu amo atrizes e atores, eu gosto de trabalhar com eles. Gosto de bordar, gosto de ir junto, então, na verdade, eu nunca abandonei a atuação de alguma maneira, só não estava presente assim, mas eu acho que também a direção era um exercício constante de atuação, mesmo que não fosse com a personagem, era com o ator.


MCB: Você é de outro grupo muito bem-sucedido, que é o Grupo 3 de Teatro

YN: Nele, eu fiz duas direções e duas atuações. Tem o “Continente Negro”, que era
maravilhoso, eu adorava fazer, com direção do Aderbal Freire-Filho, e agora “Contrações” (direção de Grace Passô).

MCB: Tem o espetáculo sobre o Murilo Rubião.

YN: “O Amor e outros estranhos rumores”. Tem “A Serpente” e também tem um embrião que é a minha chegada, o “Noites Brancas”, que é um espetáculo que eu tenho uma relação muito amorosa com ele, com os três. Eu adoro trabalhar com a Débora (Falabella), a Débora foi para mim, por muito tempo, uma espécie de outro, algumas pessoas diriam como alter ego, não sei se é, mas uma espécie de mim mesma.

MCB: Curioso que eu e Christiane (Antuña) estávamos conversando sobre isso outro dia, sobre a relação de vocês duas em cena.

YN: É uma espécie de mim mesma. A gente tem uma relação de muito afeto e muita ligação pessoal, eu acho que isso fica claro em “Contrações”, fica claro porque a gente é muito livre uma com a outra em cena. Porque no espetáculo a gente está lidando com temas muito cruéis e difíceis, né, a gente tem uma relação muito dissipada e antagônica e está polarizada, e esse amor que a gente tem uma pela outra, essa identidade uma com a outra, eu acho que é basilar nesse trabalho.

MCB: A Débora é uma grande atriz, e o jogo de vocês duas em cena é um jogo poderoso.

YN: Eu acho que a gente se alimenta uma da outra, uma é nutrição para a outra. Ela tem total liberdade comigo dirigindo e eu tenho uma sensação que ela se sente muito à vontade comigo em cena. Eu não tenho olhos sensores para ela, eu tenho olhos acolhedores e ela também comigo é todo acolhimento.

MCB: Agora, entrando no cinema especificamente, você tem uma relação forte com o cineasta Rafael Conde, não é isso? Como é que se deu esse encontro?

YN: O Rafael foi diretor do programa de entrevistas do Fernando (Rocha), que foi meu marido, na TV Minas. Ali, eu acho, que a gente começou a se aproximar. Eu fiz preparação de ator da Débora (Falabella) no curta Françoise, cheguei também a fazer um pouco de preparação para o curta A hora vagabunda. Eu costumo dizer que eu imito o Rafael, verdade, esse texto, por exemplo, foi ele que descobriu o autor. O Rafa é meio um farol para mim, eu aprendi demais com ele, ele é um cara que sabe das coisas.



MCB: Essa preparação de atores para os filmes difere muito da direção no teatro? Foi difícil para você?

YN: Eu fui muito ligada ao Rafa, ao que ele quer, na verdade eu sou um braço dele. Ele me pede coisas e eu vou fazendo, sugiro uma coisa ou outra. Ele é aberto. Eu tenho uma expressão no teatro que é um pouco mais grandiloquente do que no cinema, eu posso até passar por essa grandiloquência, mas depois eu tenho que recuar. O Rafa até fala “Menos Yara, menos marca, está muito formal”. Eu tenho um formalismo, eu gosto de um certo formalismo, eu acho que no meu trabalho de atriz fica claro que eu tenho um repertório de ações escolhido ali no trabalho como diretora. E aí quando eu levo isso, o Rafa corta minhas asinhas na hora.

MCB: Você fez a preparação do Chuva nos telhados antigos também, não é isso? Eu adoro esse filme.

YN: Preparei.

MCB:Tem o Alexandre (Ciolleti) e a Mônica Ribeiro. É de uma beleza impressionante.

YN: A gente vai fazer uma direção juntas agora. A Mônica é uma parceira que eu tenho também. Engraçado, quando eu saí da Oficina de Teatro, acho que uns três ou quatro anos depois a Mônica entrou. Eu fui monitora dela, então eu conheci a Mônica muito mocinha, com 14, 15 anos, e desde lá eu já fiquei encantada com a beleza, com a energia, como ela é grande, como ela é artista. Também com a mãe que tem (Ione de Medeiros)

MCB: E aí você faz como atriz o Samba canção, do Rafael.

YN: Louca, né, polêmica, tem hora que ela começa a trepar com todo mundo para conseguir fazer o filme e não consegue, isso que é triste.

MCB: O Samba canção é um filme inteligente e que brinca com os formatos todos do cinema, Super 8, 16mm, 35mm. Foi bacana fazer como atriz?

YN: Eu acho que o Rafa é um diretor de filmes raros, não necessariamente filmes
que vão fazer sucesso, filmes raros, filmes assim quase enciclopédicos, como se daqui há muitos anos as pessoas fossem falar “Ah, vamos ver aquele filme do Rafael Conde”. Eu tenho um enorme prazer e eu me sinto lisonjeada de trabalhar com ele. O Samba canção foi uma delícia, era ótimo. Estava em casa, era divertido, gostava de tudo, gostava do texto, gostava da personagem. Essa paixão que a personagem tinha pelo cinema, como que ela fazia de tudo, ela foi capaz de matar e criar fórmulas para conseguir um filme. Que paixão é essa, essa obsessão? É claro que tem uma caricatura ali, mas a gente é assim, a gente não escolheu uma profissão, né. Aqui no Brasil, agora que o cinema está ficando mais rentável, mas não é profissão, é jeito de viver, e aí a gente chega às últimas consequências. Eu mesma cheguei às últimas consequências, quando eu fazia “Trivial Simples”, as pessoas não acreditavam que eu, com oito meses de gravidez, fazendo aquilo. Tinha uma violência inclusive, uma intensidade física. Claro que eu estava toda resguardada ali, mas é algo que não é comum, essa escolha não é uma escolha comum. Eu dou aula e costumo dizer para os meus alunos, alguns atores, que eu acho que o teatro tem uma coisa de entidade, assim, “Olha, vê se o teatro está acenando positivamente”. Porque, às vezes, não, e se não acena positivamente você fica muito marginal, sabe, em uma escolha que é já meio uma escolha marginal. Eu vejo atores dizendo o tempo inteiro, “Nossa, eu tenho dinheiro até tal data e depois tenho que…” É uma loucura, né, então não é uma escolha profissional.

MCB: Você tem outra experiência linda com Rafael que é o longa Fronteira.

YN: É maravilhoso, com minha sobrinha, a Debinha Gomes (Débora Gomes). Ali tem um acaso muito engraçado, o Rafael me deu uma personagem que era a visitante. Eu fiz a preparação e eu disse “Essa personagem vai cair Rafael, eu te conheço”, “Claro que não vai cair”, “Esse personagem vai cair”. Daí, pintei meu cabelo de preto e filmei. E aí, passou, e ele “Yara, tô te ligando porque estou aqui na ilha, seu personagem caiu, mas tem uma hora que você fecha uma janela”. Eu sabia que iria cair, iria chegar uma hora que ele iria cortar tudo.

MCB: Tem um outro filme seu, do Ricardo Elias, o Os 12 Trabalhos.

YN: Eu fazia uma faxineira. E fiz agora o curta Doce segredo de Bárbara, do Paulo Augusto Gomes. Foi uma delícia fazer.

MCB: Trabalho de atriz, né?

YN: E como foi nostálgico aquilo para mim, foi nostálgico ver o Paulo (Paulo Augusto Gomes, diretor). Não foi a minha primeira experiência com o audiovisual, eu já tinha tido, o Edmundo (Novaes) meu irmão, tinha um grupo com outras pessoas, com o Alcino Neto, que faziam uns filmes Super-8 e eu fazia como atriz, era um grupo muito legal. O do Paulo Augusto foi a hora que tive o primeiro contato com o cinema, mas não deu certo, o filme foi interrompido. Deu uma série de problemas técnicos, ficou desfocado, o Paulo ficou muito
chateado. Foi muito difícil para ele e foi difícil para todos nós, porque a gente se entregou
aquilo. E agora ele retomou o projeto e concluiu.

MCB: O filme é lindo, eu escrevi sobre ele.

YN: Eu falei “Paulo, que projeto maravilhoso” Você poder retomar algo, que beleza, e de uma maneira tão dialética, tão interessante. E com um resultado muito bonito.

MCB: Para terminar, as únicas duas perguntas fixas do site: Qual o último filme brasileiro a que você assistiu? E qual mulher do cinema brasileiro, de qualquer época e de qualquer área, você deixa registrada na sua entrevista como uma homenagem?

YN:  Tatuagem (Hilton Lacerda), amei aquele filme, em tudo, gostei do roteiro, gostei do tema, gostei da montagem, gostei de vários atores. Quanto à mulher, tantas estão vindo na minha cabeça… Gosto muito da Daniela (Thomas) quando ela vai para o cinema. O Terra Estrangeira, ela junto ali com o Waltinho (Walter Salles), tem muito dela ali, é tão lindo o que a Daniela faz no cinema.Com o Flipe Hirsh também. Sou muito fã da Daniela, acho
que ela é uma grande artista brasileira.

MCB: Muito obrigado.

Entrevista realizada em abril de 2014 durante a temporada do espetáculo “Contrações”, no CCBB BH.
Foto atualizada.

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Sala 
 Sala Dina Sfat
Atriz intensa nas telas e de personalidade forte, com falas polêmicas.