Ano 20

17ª Cineop -Roda de Conversa+Mostra Histórica

Roda de Conversa Processos de Criação de Cineastas Indígenas - Foto: Nereu Jr.
Mais uma cobertura da 17ª Cineop - Mostra de Cinema de Ouro Preto ontem, 25, dedicada ao cinema indígena, com uma Roda de Conversa e exibição de filmes.

A Roda de Conversa Processos de Criação de Cineastas Indígenas reuniu sete diretores: Divino Tserewahú, Genito Gomes, Jocy Guajajara, Johnn Nara Gomes, Kiripuku, Morzaniel Iramari e Wera Alexandre, com mediação de Clarisse Alvaenga.

Todos eles estão com filmes sendo exibidos na Cineop, então falaram de seus processos e também sobre os filmes programados.

É impressionante ver o alcance do Vídeo nas Aldeias, projeto que teve início em 1986 e que, desde então, vem atuando para a produção do cinema indígena, apoiando suas lutas, identidades e territórios, acumulando hoje mais de 70 filmes.

O cinema indígena tem uma profusão de singularidades, pois como é produzido por vários povos e em diferentes aldeias, ele traz para as telas não só os modos diversos de vivências, como também diferentes processos de criação.

Dessa forma, há tanto as tensões nos próprios processos de filmagens, como cineastas, assim como todo o povo da aldeia, permanentemente ameaçados por invasores, pistoleiros e milícias, como benção de autorização de pajés para que filmes sejam realizados.

A Roda de Conversa abordou todas essas questões, sendo o depoimento da cineasta Johnn Nara Gomes um dos mais fortes, pois reviveu, emocionada, o assassinato de um líder na aldeia há 11 anos, cujo corpo jamais foi encontrado. A cineasta ressaltou que os indígenas não querem briga com ninguém, só querem seus direitos às suas terras e territórios, e que vê no cinema, especificamente na câmera, uma arma para registrar e denunciar essa violência que se abate cotidianamente sobre os povos originários. "Nós corremos perigo todo dia, desde quando acordamos". 


Curtas e Média

A Mostra Histórica, um dos recortes da 17ª Cineop, além do Seminário, exibiu dois curtas e um média, todos eles produções do cinema indígena, dos cineastas presentes na Roda de Conversa.

Foram exibidos:: KAN´A ZAR UKYZE UÁ - Os Donos da Floresta em Perigo, de Flay Guajajara, Erisvan Bone Guajajara e Edivan Guajajara; YVY REÑOI - Semente da Terra, de Ascuri (Associação Cultural de Realizadores Indígenas); e AVA YVY VERA - A Terra do Povo do Raio, de Genito Gomes, Valmir Gonçalves Cabreira, Johnaton Gomes, Joilson Brites, Johnn Nara Gomes, Sarah Brites, Dulcídio Gomes e Edna Ximenes.

KAN´A ZAR UKYZE UÁ - Os Donos da Floresta em Perigo coloca em cena os Guajajara, povo indígena que vive na Amazônia e os isolados,  indígenas divididos em pequenos grupos que vivem no meio da floresta sem contato com o mundo exterior. 

Um grupo de Guajajara atua como os Guardiões da Floresta e sua função é monitorar a floresta, cotidianamente aviltada pelos invasores madeireiros. E é em uma dessas andanças que ele ficam frente a frente com um grupo de isolados, os Awa Guaja. Conforme o filme relata, há um respeito mútuo em relação à distância mantida em relação aos isolados, mas esse encontro inesperado acaba por gerar um registro deles, que são filmados pela primeira vez pelos Guardiões.  

KAN´A ZAR UKYZE UÁ - Os Donos da Floresta em Perigo aborda o território em que vivem os Guajajara e os isolados, a Terra Indígena Arariboia, as invasões dos madeireiros e seus pistoleiros, que os colocam permanentemente em risco, sobretudo os isolados. E é no registro fílmico dos isolados que o filme ganha ainda uma camada mais profunda, em que, a partir de um close de um dos isolados, pode-se ver uma liberdade ameaçada e uma fragilidade exposta.

YVY REÑOI - Semente da Terra parte de uma onda de assassinatos de uma milícia mantida por fazendeiros contra  os povos que vivem na Retomada Kaiowá e Guarani. Eles matam um agente de saúde e uma criança, além de ferir outros moradores.

O filme abre com imagens do atual presidente, o inominável, que, ainda antes de ser candidato, visita o Mato Grosso do Sul cinco dias antes do atentado, prometendo amparo e tecendo loas aos ruralistas.

As mortes e a violência praticadas coloca os povos da Retomada em estado de alerta e de guerra, o que YVY REÑOI - Semente da Terra focaliza a partir de um roteiro e direção em crescente tensão, seja nos relatos e filmando e revivendo o momento dos assassinatos, como na própria trilha sonora, em que o rap anuncia e evidencia o confronto.

AVA YVY VERA - A Terra do Povo do Raio  tem como foco a história dos Guarani Kaiowá que vivem na Retomada. O filme parte de sua cosmologia para abordar os desafios e perigos atuais que enfrentam na Retomada para continuarem existindo.

É da terra que vem tudo os que os Guarani Kaiowá necessitam, como as árvores, a mata, as frutas, os remédios, as nascentes, a caça, a tradição, mas com o avanço cada vez maior do agronegócio no Mato Grosso do Sul, em que plantações de soja dizimam florestas e matas, a vida do povo é ameaçada cotidianamente.

Com imagens poderosas, como os próprios raios que cortam o céu e seus significados para o os Guarani Kaiowá, o filme é marcado ainda pelo assassinato de um dos líderes  da aldeia, fato encrustado na memória e coração do povo e um dos símbolos de resistência e de luta em defesa de seu território.


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17ª Cineop - Mostra de Cinema de Ouro Preto 
De 22 a 27 de junho de 2022
Programação gratuita - cineop.com.br

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Sala 
 Betty Faria
Com amor profundo pelo cinema, premiada em vários festivais no Brasil e no exterior