Ano 20

dona da história, A, 2004, Daniel Filho

O filme é de Marieta

Não é preciso olhar muito de perto para ver que as produções da Globo Filmes investem mesmo é no cinema de entretenimento e ponto. Mesmo em Carandiru, que seria um exemplo de um cinema mais engajado, já que é dirigido por Hector Babenco, está presente o uso de uma fatia generosa de investimento na exploração pelo emocional do espectador. 

Até agora, os filmes de Guel Arraes são os melhores produtos da Globo Filmes; são deliciosos O auto da compadecida e Lisbela e o prisioneiro. O último rebento de sucesso do filão é A dona da história, de Daniel Filho, e é um bom divertimento, é divertido assistir, é "cinema de shopping". Adaptação cinematográfica da peça de sucesso de João Falcão, o filme cumpre à risca o projeto da produtora. Muita gente apontou o dedo em riste para o conservadorismo da história, em que uma mulher questiona seu presente e, conseqüentemente, seu futuro, e meio como a Peggy Sue de Kathelen Turnner, do filme de Coppola, tem a chance de modificá-lo, mas acaba por cumprir seu destino inicial. 

O filme pode ser conservador mesmo, já que a vida fora do casamento para a protagonista está na opção da solitária amarga ou na da atriz consagrada, mas frustrada. Apostar no amor não tem nada de conservadorismo, nos dias de hoje chega a ser vanguarda, mas a forma como o roteiro faz a personagem optar por ele carrega mesmo um ranço. 

No entanto, mais do qualquer coisa, A dona da história é um filme para o talento de Marieta Severo. A atriz, que encenou a peça pelos palcos do Brasil, está à vontade em cena e, mais uma vez, fenomenal. Marieta Severo está em momento de maturidade artística e é bom mesmo que o cinema possa registrar isso. Poucas atrizes conseguem imprimir uma carga de verdade como ela faz com seus personagens, seja como está nesse filme ou mesmo na telinha, como em A grande família

Marieta faz a Carolina atual, que na juventude é interpretada por Débora Falabella, sendo que a personagem vive os dois tempos ao mesmo tempo com as duas atrizes se contracenando. Luiz Cláudio é seu par amoroso, o namorado e  o marido, vividos por Rodrigo Santoro e Antônio Fagundes. 

Daniel Filho é um diretor um tanto quadrado, tanto para o bem quanto para o mal do termo. Em A dona da história realizou seu melhor filme até agora, de O casal (1975). Além de Marieta, Débora Falabella compõe a Carolina questionadora com o talento já testado. De tão simpática e interessante que é, a começar pela voz, ela é daquelas atrizes que a gente quer gostar. Porém, no filme ela tem menos chances, já que ele é mesmo de Marieta. 

Fernanda Lima como Maria Helena,  a amiga da Carolina da juventude, compõe a personagem com aquele ar naturalista que infesta as novelas, e Giulia Gam, apesar de talentosa, não diz muito a que veio como a mãe de Carolina. 

Nas participações, que são mínimas, Renata Sorrah passa meio que em branco. É curioso comparar com a sua aparição também mínima em Nina, de Heitor Dhalia. Pelo segundo filme fica comprovado que mesmo quando o tamanho da aparição quase não existe, um bom ator, bem dirigido,  sabe aproveitá-lo com toda a sua potencialidade, já que em Nina, Renata nos rouba o olhar com a sua prostituta decadente em cena relâmpago. 

Bianca Byington e Dedina Bernadelli formam o par de namoradas (ou casadas) que quer comprar o apartamento de Carolina. Dedina, aliás, estava longe há décadas das telas em longas, pelo menos desde 86 quando foi uma das vampiras de Ivan Cardoso em As sete vampiras

 Na ficha técnica, quase toda formada por homens, a presença de Bia Salgado nos figurinos e na maquiagem. 

 A dona da história, Brasil, 2004, 1h29. Direção: Daniel Filho

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 Léa Garcia
Dona de um talento ímpar e altivo, Léa Garcia brilha no teatro, na TV e no cinema.