Ano 20

alguém..., 1978, Julio Xavier da Silveira

universo mítico não dá liga

André Carneiro (9/05/1922 - 4/11/2014) tem trajetória importante como poeta, contista, romancista, artista plástico e fotógrafo – como poeta foi nome de destaque na Geração 45, ao lado de mestres como João Cabral de Melo Neto, Clarice Lispector, João Guimarães Rosa, Ariano Suassuna, Mário Quintana e Lygia Fagundes Telles. E foi um dos pioneiros e maiores escritores do gênero ficção científica no país. Nascido em Atibaia, São Paulo, foi ligado ao cineclubismo e dirigiu filmes experimentais. Um deles é o belo Solidão (1951), representante do Brasil no festival de cinema amador na Inglaterra. É de sua autoria o conto "Mudo", adaptado para o cinema no primeiro e único longa do cineasta paulista Júlio Xavier da Silveira, alguém... (1978). 



Em alguém... Nuno Leal Maia é o estranho e enigmático Mudo, um camponês que vive e trabalha nas terras do fazendeiro Henrique Cesar e sua família formada pela esposa Rachel Araújo, em ótima composição, e os filhos do casal Denis Derkian e Myriam Rios - depois ainda chega o professor de francês Ewerton de Castro. Mudo fica horas passando a mão em plantações, como frutas e flores, e olhando fixamente para elas. O resultado? Jabuticabas, uvas, pêssegos e flores atingem tamanhos enormes, independentemente de suas estações climáticas específicas. Tido como excêntrico e até mesmo como santo por alguns moradores rústicos da região, é na Casa Grande que ele vai causar ebulição ao despertar o interesse da adolescente rica, que vai iniciar uma relação com o rapaz, que poderá significar sua rendição ou perdição. alguém... procura instalar um registro sério e de ambiência intimista, no mundo telúrico de Mudo em contrapartida ao mundo de whisky, Elvis Presley, vitrola e lambreta da família. Tudo situado em universo com elementos do fantástico – as mutações na natureza sem explicação lógica - e um despertar da juventude nos anos 1950. Bom, mas aí Júlio Xavier da Silveira comete o primeiro pecado: a escalação de Nuno Leal Maia como o protagonista. Nuno é ator de talento e uma das caras mais legítimas do cinema dos anos 70 e 80, mas é impossível vê-lo em volta de suas uvas verdes enormes sem vir imediatamente à cuca seu matuto de O bem dotado – o homem de Itu (1977), de José Miziara. Daí fica difícil embarcar de verdade naquele universo proposto, já que a comédia rasgada de Miziara fica o tempo todo perambulando as ideias e embaçando o clima - os dois filmes são mais ou menos da mesma época, mas como O bem dotado foi sucesso e esse não, o primeiro se impõe no imaginário, Segundo: a direção não consegue ligar, em sentido orgânico, os diferentes planos da narrativa. O universo de Mudo e da casa grande até que sim por causa do fascínio recíproco entre ele a personagem de Myriam Rios – linda e muito antes de se transformar na política homofóbica atual; mas o mundo dos outros moradores, camponeses que destilam maledicência em seus repentes sobre os personagens, fica descolado do resto. Com tantos descompassos, alguém... é filme que fica pelo meio do caminho, ainda que ao terminar a gente nem saiba mesmo por onde andou ou ficou.


quarta-feira, 13 de janeiro de 2016

Longas Brasileiros assistidos em 2016 (013)



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Sala 
 Léa Garcia
Dona de um talento ímpar e altivo, Léa Garcia brilha no teatro, na TV e no cinema.