Ano 20

Simone Spoladore

A atriz Simone Spoladore nasceu em 29 de outubro de 1979, em Curitiba (PR). O começo da carreira artística foi ainda na infância, no balé, depois no teatro, e a admiração por duas artistas marcou a atriz. Uma é a bailarina Ana Botafogo: “Eu queria ser bailarina e as professoras diziam que uma bailarina também tem que saber interpretar. Eu era apaixonada pela Ana Botafogo, eu fui vê-la algumas vezes e eu nunca mais esqueci, uma emoção muito grande, ela realmente interpreta em cena. Eu me lembro do dia que fui ver a Ana Botafogo no Teatro Ópera de Arame, eu fiquei arrepiada, ela realmente é uma bailarina que interpreta e essas experiências foram muito marcantes”. A outra é a atriz Denise Stoklos: “Quando eu a vi pela primeira vez, o publico inteiro ficou aplaudindo ela de pé, durante 10 minutos, e eu me lembro que quando eu saí a minha mão estava doendo de tão forte que eu batia palmas para ela. Eu acho que ela também me fez apaixonar pelo teatro”.

A consagração de Simone Spoladore como atriz vem já em seu primeiro filme, Lavoura arcaica (2001), uma adaptação primorosa do romance homônimo de Raduam Nassar, dirigida por Luiz Fernando Carvalho. O filme coloca a atriz definitivamente no cinema e na mira de diversos cineastas, e já é escalada para protagonista em seu segundo filme, o belo Desmundo (2002), de Alain Fresnot. A responsabilidade de protagonizar não a assustou: “Olha, tudo é difícil, né, mas quando a gente é jovem a gente não pensa nisso, a gente age mais por impulso e pela paixão de estar fazendo. Então eu me joguei naquilo, era uma oportunidade que estava me dando, era uma carreira com toda força e fui fazendo assim”.

Simone Spoladore constrói carreira marcante nas telas, e depois de vários personagens densos, surpreende no tom cômico de sua atuação no delicioso Elvis & Madonna (2010), de Marcelo Laffitte: “Foi uma descoberta, foi muito bom descobrir essa possibilidade, porque de uma certa maneira eu estava, sem perceber, carregando um pouco a história desses personagens na minha vida. Estava sendo um pouco pesado, sabe, eu senti isso, teve um momento que eu senti que precisava descobrir outras coisas, e ai a comédia veio para dar um refresco, dá para atuar de outro jeito também”.

Simone Spoladore foi a grande homenageada da 16ª Mostra de Cinema de Tiradentes, em janeiro de 2013. A agenda apertada limitou uma entrevista mais longa e mais detalhada em sua carreira, mas ainda assim ela conversou com o site Mulheres do Cinema Brasileiro e falou sobre algumas passagens de sua carreira, os filmes, o trabalho com as diretoras, a escolha das produções, a descoberta da comédia, entre outros assuntos.



Simone Spoladore fala sobre sua trajetória:

Balé clássico, eu me dediquei a isso por 10 anos, e durante esse percurso eu descobri o teatro. Porque eu queria ser bailarina e as professoras diziam que uma bailarina também tem que saber interpretar. Eu era apaixonada pela Ana Botafogo, eu fui vê-la algumas vezes e eu nunca mais esqueci, uma emoção muito grande, ela realmente interpreta em cena. Eu me lembro do dia em que fui ver a Ana Botafogo no Teatro de Arame, eu fiquei arrepiada, ela realmente é uma bailarina que interpreta e essas experiências foram muito marcantes. Falando de pessoas a que eu assisti e que me levaram a ter essa paixão pelo teatro, que começou no teatro, foi a Denise Stoklos, que eu vi lá em Curitiba também. Quando eu a vi pela primeira vez, o público inteiro ficou aplaudindo ela de pé, durante 10 minutos, e eu me lembro que quando eu saí a minha mão estava doendo de tão forte que eu batia palmas para ela. Eu acho que ela também me fez apaixonar pelo teatro, além da experiência que eu comecei a ter com 11 anos, quando eu fui fazer teatro na ABB. Eu me lembro da emoção que senti na primeira vez em que fiz uma cena com meu professor, foi uma emoção muito forte, eu achei que ele me puxou, assim, para o teatro. Eu continuei fazendo dança, mas depois não aguentei mais e fui fazer cursos.

Eu comecei a trabalhar, muito jovem, com 16 anos já estava trabalhando. Fiz a peça Meno male, uma produção curitibana, é uma comédia. Depois disso fiz peças infantis e comecei a trabalhar profissionalmente também no teatro adulto, lá em Curitiba. Essas experiências foram bem marcantes na minha vida, com o passar do tempo é que você vai percebendo como as coisas vão ressoando mesmo na sua trajetória. Eu acho que esse período, esse começo, em que tive contato com esses diretores que estão investigando linguagem dentro do teatro, eu acho que eu trouxe isso comigo no decorrer da minha trajetória em relação ao cinema, em relação ao meu desejo de buscar outro jeito de interpretar. Eu acho que não existe um padrão de interpretação, existem várias maneiras de se interpretar, quando você vê uma Helena Ignez em cena, por exemplo, é uma Helena Ignez que faz aquilo, não existe uma outra pessoa parecida.

Mulheres do Cinema Brasileiro: Você foi dirigida por cineastas, Helena Ignez (Canção de Baal), Daniela Thomas (Insolação), Lúcia Murat (A memória que me contam). Tem alguma diferença para você em relação ao set, esse set sendo dirigido por mulheres, ou é a mesma coisa que por homens? 

Simone Spoladore: Então, a Daniela Thomas não dirigiu no set, só o Felipe Hirsch estava no set, então o que eu posso falar é da Lúcia Murat e da Helena Ignez. E da Marcela Lordy também, eu fiz um filme com ela em São Paulo, A musa impassível. Eu fico muito feliz quando as diretoras são mulheres, me inspiro muito nelas, quero ser como ela, sabe, eu tenho muita admiração pela Lúcia, pela Helena, pela Marcela. E eu acho que o cinema precisa mesmo dessa contribuição feminina, acho que o cinema vai ganhar muito com essa contribuição feminina, está ganhando muito. Engraçado, as três, por exemplo, nesse caso, elas trabalham com o coração e estão tentando se reinventar e contar as próprias histórias, acho isso muito forte. Acho que o universo feminino é diferente sim do universo masculino, apesar de terem coisas semelhantes e terem coisas diferentes. Então eu acho que pode-se ganhar muito nessa androginia, né, não ser só masculino e nem só feminino, mas pode ter essas duas nuanças. Eu fico muito emocionada, por exemplo, quando eu vejo aqui a filha da Lúcia, que está fazendo aquele filme lindo, uma menina da minha geração fazendo um filme como aquele, isso me emociona demais, fico muito feliz.

MCB: E você pensa em contar essas histórias como atriz ou pensa, por exemplo, em ser diretora?

SS: Olha, eu penso sim em ser diretora, mas é uma coisa muito embrionária e eu não sei se isso vai acontecer ou não. Eu penso, eu tenho esse desejo, essa imagem, agora se ela vai se concretizar ou não só o tempo vai dizer.

MCB: É verdade que você não tinha feito inscrição para o teste do Lavoura arcaica?

SS: Então, aconteceu assim, eles me ligaram um tempo antes dizendo que ia ter esse filme, e aí eu li o livro inclusive, mas nunca me chamaram para fazer o teste, nunca mais, esqueceram. Eu estava em uma festa à noite, tinha passado da meia-noite, e dois amigos meus iam fazer o teste no dia seguinte em um teatro, Brincante, lá em São Paulo. Eu falei “vou com vocês”, e eu fui. Lá, eles falaram que iam me chamar para fazer um teste. No dia seguinte me ligaram para eu fazer o teste, eu estava em uma pensão, eu morava em uma pensão em São Paulo. Me ligaram, estava chovendo, eu fui para lá, cheguei e fiz o teste. Tinha uma diretora, assistente de direção, e ela falou assim “e aí, vai fazer o teste para quais papéis? a gente está fazendo o teste, tem a Ana”. E eu “eu quero fazer a Ana”.

MCB: Logo depois você vai ser a protagonista do Desmundo, que é também um filme lindo. Foi convite ou foi teste?

SS: Teste. O Desmundo foi uma história longa de teste também. Eles me chamaram para fazer o teste e queriam que eu fizesse outro teste, mas eu falei que não iria fazer. Eles queriam me colocar em uma oficina com outras atrizes para daí escolher a atriz, e eu achei muito estranho, porque o diretor, se ele vê uma atriz, ele sabe se é aquela atriz ou não, não precisa fazer milhões de testes, ou é aquela ou não. Eu falei que não ia fazer a oficina, e aí, mesmo assim, no final das contas eles me chamaram.

MCB: E já como protagonista do filme. Foi difícil para você, que veio da dança, do teatro desde cedo, já no cinema, e em um segundo filme, encarando uma protagonista? 

SS: Olha, tudo é difícil, né, mas quando a gente é jovem a gente não pensa nisso, a gente age mais por impulso e pela paixão de estar fazendo. Então eu me joguei naquilo, era uma oportunidade que estava me dando, era uma carreira com toda força e fui fazendo assim.

MCB: E você deu continuidade à sua carreira cinematográfica, são muitos filmes, tornou-se o seu veículo de preferência?

SS: Com certeza.

MCB: E esses personagens você faz como? Você olha o perfil do personagem ou olha o do diretor?

SS: Depende muito, depende muito. Às vezes o próprio roteiro me encanta, às vezes o personagem me encanta. Às vezes é porque eu acredito em fazer o primeiro filme e aí eu falo “eu vou experimentar isso com esse cara”. Eu gosto muito de estar no set, eu acho que é uma experiência muito boa, você aprende a trabalhar em conjunto e todo mundo contribui para aquele instante que você está fazendo, criando ali. É uma emoção muito grande estar em um set de filmagem, acho que essa emoção é que me conduz e vai me levando. Agora, as escolhas, com o tempo, agora que eu estou... Acho que fui movida muito por impulso nesse primeiro momento, algumas coisas eu não fiz, mas agora eu sinto que vou ter que ser um pouco mais precisa nessas escolhas, porque tem alguns filmes com que você acaba se decepcionando um pouco, então eu acho que eu vou começar a ter que ser um pouco mais precisa nisso. Alguns não, um só, na verdade, mas então acontece esse tipo de coisa.

MCB: Você tem personagens muito densos. Daí, quando você faz a Elvis (Elvis & Madonna), que é uma personagem maravilhosa, foi difícil aquele registro de comédia para você? Ou comédia e drama, para você, tanto faz?

SS: Foi uma descoberta, foi muito bom descobrir essa possibilidade, porque de uma certa maneira eu estava, sem perceber, carregando um pouco a história desses personagens na minha vida. Estava sendo um pouco pesado, sabe, eu senti isso, teve um momento em que eu senti que precisava descobrir outras coisas, e aí a comédia veio para dar um refresco, dá para atuar de outro jeito também.

MCB: Que é um registro que você tem feito na televisão.

SS: Pois é, veio logo depois, na televisão também, que é o registro cômico.

MCB: E nesses filmes todos você tem um filme do coração? 

SS: Não, não gosto de escolher, porque são momentos muito marcantes.

MCB: Qual foi o último filme brasileiro a que você assistiu? Essa é uma pergunta fixa do site que eu faço sempre.

SS: Acho que foi o da Júlia Murat (Histórias que existem só quando lembradas).

MCB: Só uma última pergunta. Quem você homenageia nesta entrevista, uma mulher do cinema brasileiro de qualquer época e de qualquer área?

SS: Helena Ignez.

MCB: Por quê?

SS: Porque quando eu vi a Helena pela primeira vez em cena eu nunca mais esqueci, o trabalho dela é muito forte, muito impactante, ela é uma atriz única no cinema brasileiro. E eu acho que ela construiu isso que é muito bonito também, que você percebe claramente quando existe uma parceria em cena, diretor e atriz, isso é transformador, é único e ninguém consegue repetir. Não adianta, você pode ter mil preparadores de elenco, você pode ter um diretor de fotografia maravilhoso, mas o que determina mesmo aquele instante de cinema é a relação entre as pessoas, isso fica muito claro ali.

MCB: Obrigado pela entrevista.



Entrevista realizada durante a 16a Mostra de Cinema de Tiradentes, em janeiro de 2013.

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 Sala Dina Sfat
Atriz intensa nas telas e de personalidade forte, com falas polêmicas.